O Brasil é um país curioso.
Pequenos ladrões, ainda que por furtar alimentos, ficam presos, enquanto corruptos respondem a processos em liberdade.
Mas não é só. O que me chamou a atenção foi a história de um rapaz no interior (Itápolis) que teria furtado 384 livros para, segundo diz, lê-los. Ele, como era de se esperar no nosso País, encontra-se devidamente enjaulado. Sim, enjaulado, pois as nossas cadeias mais parecem jaulas que locais de habitação de seres humanos.
Isso me fez lembrar a história de dois meninos que atendi enquanto era defensor na Vara da Infância e da Juventude. Eram dois irmãos que haviam subtraído dois cadernos. O objeto furtado chamou a minha atenção e perguntei o motivo deles terem entrado numa grande rede de lojas para pegar dois cadernos sem pagar. A resposta me comoveu: "foi para poder estudar". Eles eram muito pobres, ao menos foi a impressão visual que tive. Ora, numa Vara Especializada, como a da Infância e da Juventude, em um país de primeiro mundo ou mais sério no trato das pessoas, eles e os genitores seriam inseridos automaticamente em programa assistencial. Mas não foi assim. No Brasil, o Poder Executivo não está presente para resolver problemas sociais que por força de nossas mazelas desaguam no Judiciário. Está presente no fórum apenas para tratar de questões burocráticas de internação ou desinternação, esquecendo-se de cada brasileiro, de suas necessidades e potencialidades.
Não sei o que aconteceu com aqueles dois garotos, mas para mim, eles eram pequenos "heróis" que, num país injusto e que não prima pela educação, almejavam se instruir. E isso, para um País de analfabetos políticos e de pessoas que sequer sabem compreender textos, não é salutar. O bom, para os dirigentes desse país, é ter pessoas que não compreendem as falas, não questionam e votam em seres que falam frases curtas, sem qualquer conteúdo ou pretensão de resolver efetivamente um problema.
E aí está o círculo vicioso que atormenta o país. Quem não entende e quem é mal intencionado vota em quem não é honesto e não se propõe a resolver problema algum, a não ser o próprio, e isso se eterniza numa espiral que transforma-se em grande redemoinho que devasta tudo o que o país já conseguiu implementar de bom nesses quase dois séculos de "independência".
Quem procura instruir-se ou alimentar-se, pelas vias ilegais, não é nada bem visto no nosso país e responde ao processo judicial devidamente encarcerado. Soa como um ultraje, para alguns, a vontade de sobreviver física e intelectualmente, quando a sentença de morte física e intelectual já é aplicada logo ao nascer. Enquanto isso, os abonados que praticam os mais horrendos crimes, como tráfico ou corrupção, e que devasta não só a economia, mas a própria democracia, muitas vezes encontram-se soltos.