“Enquanto restar um único humano,
a humanidade persistirá, mesmo diante da dor e das atrocidades. Os índios
sobreviveram. Os negros também. Os ciganos e os judeus idem. Os sírios
sobreviverão. Mas para fazer frente a tantas formas de desumanidades, os direitos
humanos devem se fazer presentes, de forma célere e firme”.
O ATUAL CAMINHO DE DAMASCO
Primeira Parte – A DESUMANIZAÇÃO
CAUSADA PELA GUERRA
Tenho ascendência
síria, dentre outras etnias.
O meu avô, pobre,
mas culto, falava inglês, francês, turco e aramaico, além do árabe, e veio para
o Brasil fugindo da guerra logo no início do século XX.
Da minha família, a
imagem mais marcante que criei desde novo é a de uma criança pequena, de seis
anos, perdida em um deserto, logo após todos os seus familiares e habitantes do
vilarejo em que moravam terem sido assassinados brutalmente. Essa história é
baseada em fatos reais, mais precisamente na minha então pequenina trisavó,
socorrida por freiras francesas e levada a um convento, onde cresceu e conheceu
o seu futuro marido.
Por isso, para mim,
no meu imaginário, as crianças sírias são as mais lindas do mundo, as mulheres
de lá são as mais fortes e destemidas e o sírio é um povo simples, mas culto e
visivelmente sofrido por milênios de dominações e exploração.
Hoje, a terra de
parte dos meus antepassados vivencia a maior catástrofe humanitária mundial dos
últimos 25 anos. Dos seus 17 milhões de habitantes, 4 milhões se refugiaram em
outros países e 7 milhões e 600 mil pessoas se deslocaram internamente,
buscando sobreviver em meio ao caos criado por uma sangrenta guerra civil
iniciada em 2011. Dos sírios que ainda habitam o país, 9,8 milhões vivem com
insegurança alimentar, com 6,8 milhões delas em situação grave, segundo a ONU.
É um número muito alto, onde a economia esfacelada faz rarear o emprego e a
renda, acarretando a fome e proliferando as doenças.
A situação
demonstra ser ainda mais grave quando se depara com o número de mortos. Já são
mais de 220 mil sírios mortos, entre mulheres, crianças, civis, militantes e
soldados do governo. Um fato nem sempre abordado é que há muitos órfãos
espalhados pelo país.
O que também é
alarmante é a notícia de que governo e alguns grupos rebeldes são acusados de
torturar, executar e de usar as terríveis armas químicas contra a população.
A guerra síria
reúne um emaranhado de grupos e de interesses complexos. No entanto, de forma
simplista, o que se destaca na mídia é a ação do Estado Islâmico que, com ações
de terror e verdadeira selvageria, impõe o pânico entre os civis.
Esse grupo radical
que adora criar polêmica, recentemente recomendou que meninas de apenas 9 anos
de idade já se casassem. Além disso, costuma escravizar e estuprar mulheres e
crianças de minorias religiosas que não reconhece, como as da comunidade religiosa
Yazidis. Também costuma assassinar, seja crucificando, queimando vivo, afogando
ou esquartejando aqueles que não se convertem ao islamismo ou que são
considerados traidores.
Nesse mundo
terrivelmente machista há heroínas que se destacam, como as voluntárias curdas
da Unidade de Defesa das Mulheres, ligadas à Unidade de Proteção do Povo, de
ideologia marxista, que já causaram grandes derrotas aos militantes do Estado
Islâmico, inclusive na cidade de Kobani, na fronteira com a Turquia, como
revela a revista Caros Amigos de julho deste ano.
Não bastassem a
guerra, as violações constantes praticadas por todos os lados do conflito, os
estupros, as escravizações, as perseguições, as torturas, as execuções, a falta
de comida e a ruína econômica dela decorrente impõem a fuga massiva de pessoas
rumo à sobrevivência. Como se pode perceber, vive-se uma crise humanitária sem
precedentes nos últimos anos, com reflexos no mundo inteiro e principalmente
nos países daquela região.
Essa é a primeira
parte de um triste texto. Nas próximas, você saberá quais medidas humanitárias
estão sendo adotadas pelo mundo e pelo nosso país, e o que mais poderia e
deveria ser feito.