terça-feira, 30 de junho de 2009

Euclides da Cunha está vivo

Veja abaixo um importante texto sobre Euclydes da Cunha.

foto: Euclydes da Cunha

por Cássio Schubsky
jornal O ESTADO DE SÃO PAULO
________________
Que falta faz ao Brasil a indignação cívica de Euclides da Cunha! Cento e vinte anos após a Proclamação da República, o gesto de rebeldia e coragem do jovem estudante militar jogando ao chão o sabre-baioneta em protesto contra o ministro da Guerra do Império continua reverberando... Aquele ato solitário de Euclides na Escola Militar, meses antes do 15 de Novembro, foi uma conclamação republicana.
(...)
Ao ler hoje textos escritos por Euclides da Cunha há mais de cem anos, causa espanto a atualidade das opiniões do autor. A primeira impressão é a de que houve uma espécie de achatamento do tempo: parece que o Brasil de um século atrás continua o mesmo. Ou serão as ideias do escritor tão poderosas, perenes, eternas que resistem ao transcurso dos anos? Ao leitor, o julgamento.
(...)
Em várias passagens de sua obra encontramos a expressão de revolta ecológica contra queimadas e desmatamentos.
(...)
Resistem ao tempo tantas injustiças sociais, como o trabalho infantil e o trabalho escravo, e lá está Euclides a reclamar "a urgência de medidas que salvem a sociedade obscura e abandonada: uma lei do trabalho que nobilite o esforço do homem; uma justiça austera que lhe cerceie os desmandos".
(...)
Inúmeras lições, enfim, deixou-nos o gênio morto há cem anos. E, apesar de todas as agruras de que foi testemunha entre o fim do período imperial e o início da era republicana, o autor de Contrastes e Confrontos (publicado em 1907) manteve-se otimista com o futuro do País, quando previu: ''Firmar-se-á, inevitavelmente, uma harmonia salvadora entre os belos atributos da nossa raça e as fórmulas superiores da República, empanados num eclipse momentâneo; e desta mútua reação, deste equilíbrio dinâmico de sentimentos e de princípios, repontarão do mesmo passo as regenerações de um povo e de um regime." Oxalá a profecia euclidiana se torne realidade um dia. Nem que para isso sejam necessários mais 120 anos de República...


Cássio Schubsky é editor e historiador.




Fonte: Estado de S. Paulo, seção Opinião, de 27/06/2009

segunda-feira, 29 de junho de 2009

Uma luta invisível

O mundo vive diuturnamente, e há séculos, inúmeras situações de injustiças. Algumas desconhecemos porque a mídia não divulga, outras são desconhecidas porque a elucidação de alguns fatos não interessa a certos governos. No fundo, há briga por territórios e riquezas minerais, como ocorre no Saara Ocidental, na Palestina, no Iraque, na Caxemira, nas Malvinas e em tantos outros lugares por nós ainda desconhecidos.





População do país africano sofre, há mais de três décadas, a opressão da ocupação promovida pelo reino de Marrocos, apoiado por potências estrangeiras

25/06/2009
Igor Ojeda
da Redação



Dos povos oprimidos, a população do Saara Ocidental talvez seja a mais esquecida do planeta. Poucos sabem que esse país do noroeste da África está ocupado desde 1882. Primeiro, pela Espanha. E, a partir de 1975, pelo Marrocos, que aproveitou a saída das tropas coloniais para impor seu domínio sobre o território saarauí, rico em fosfato, pesca e petróleo. Desde então, os saarauís, reunidos politicamente e militarmente na Frente Polisario, lutam contra as forças marroquinas – apoiadas atualmente pela França –, pela realização de um referendo sobre sua independência e, até, contra um muro de 2.500 quilômetros de extensão. Leia, a seguir, trechos da entrevista com Emiliano Gómez López, presidente da Associação Uruguaia de Amizade com a República Árabe Saarauí Democrática (RASD), que visitou por diversas vezes a nação africana.



Brasil de Fato – O que é a Frente Polisario?


Emiliano – O Saara Ocidental, era, até 1975, o Saara Espanhol. Aliás, era uma província da Espanha. Em 10 de maio de 1973, depois de um período de idas e vindas dos nacionalistas saarauís, criou-se a Frente Polisario (Frente de Libertação Popular de Saguía el Hamra e Río de Oro, as duas regiões geográficas do país). É uma frente que reúne as vontades políticas de todos os setores independentistas, que tinham abandonado a possibilidade de uma via pacífica de independência e optaram pela luta política revolucionária armada. A primeira ação militar da Frente Polisario foi em 20 de maio de 1973, data que marcou o nascimento do Exército Popular de Libertação, que hoje constitui as Forças Armadas da República. Essa organização político-militar independentista conseguiu, em dois anos e meio, tomar o controle de praticamente todo o território, estabelecer negociações políticas com o governo colonial, e chegar a um acordo de repartir o território. Tudo parecia estar encaminhado à independência, porque a ONU também a estava pedindo, desde 1963, 1964. Mas aconteceu aí uma desgraça: as mudanças políticas na Espanha, devido à morte de Franco [Francisco Franco, ditador entre 1936 e 1975]. Ele estava morrendo, a incerteza política na Espanha era muito grande, não se sabia o que ia acontecer. Muitos pensavam que poderia estourar de novo uma guerra civil, e isso foi aproveitado pelo rei de Marrocos, Hassan II [exerceu o cargo de 1961 a 1999], que montou aquela encenação da chamada Marcha Verde, quando 350 mil marroquinos armados do Corão, dos retratos do rei e das bandeiras norte-americanas, foram em massa, através do deserto, até a fronteira do Saara Espanhol para tomá-lo, para “recuperá-lo” para o reino. O governo franquista tinha assinado um acordo secreto com Marrocos e Mauritânia, para, em troca de alguns privilégios econômicos, transferir a colônia às mãos da monarquia marroquina e da presidência da Mauritânia. Foram os acordos secretos de Madrid, de 14 de novembro de 1975. Nesse momento, as tropas marroquinas já estavam invadindo militarmente o Saara, a Frente Polisario estava combatendo contra os novos ocupantes, e o exército espanhol ia entregando as posições em combate. Essa era a ordem. Que foi uma verdadeira vergonha para a Espanha.


O senhor disse que o Exército de Marrocos estava recuperando o Saara. Antes tinha o controle?


O Marrocos nunca teve nenhuma soberania sobre o Saara Ocidental. Secularmente, as tribos saarauís tinham uma forma de governo federal próprio. Tinham o chamado Conselho dos 40, que se reunia sempre que havia alguma ameaça estrangeira, para regular as relações entre as tribos. Eram os anciãos. Mas, invocando o suposto direito ancestral, o Marrocos convocou o Tribunal de Haia, para que este emitisse um parecer para ver se efetivamente o Marrocos tinha direitos. O Tribunal, depois de três meses, depois de investigar toda a documentação espanhola, argelina, marroquina, chegou à conclusão de que não havia nenhuma ligação de soberania entre o reino de Marrocos e o Saara Ocidental. Nesse mesmo dia, começou a invasão. A política do fato consumado. E desde então, estão lá.


E qual era o interesse do Marrocos em ocupar o Saara Ocidental? Por que ele queria esse território?


Há vários fatores. A monarquia, profundamente corrupta, tinha a oposição de setores nacionalistas progressistas das Forças Armadas marroquinas. Uma das razões para começar a invasão era jogar o exército lá para o meio do deserto. Quanto mais longe do palácio, melhor. Essa foi uma das razões internas. Outra razão era a de tomar o controle das jazidas de fosfato do Saara Ocidental, uma das maiores e mais ricas do mundo. Nem precisa abrir buraco, é só tirar uma camada de areia. As reservas eram calculadas em 10 bilhões de toneladas. Além disso, no mar territorial do Saara Ocidental tem um dos bancos de pesca mais ricos do mundo. Lá, todo ano pescam uns cinco, seis, oito mil navios. E todos eles pagam direitos para pescar aí. Quanto pagam? Não sei. Talvez 30, 40 mil dólares para poder trabalhar aí o ano inteiro, cada navio. Todo esse dinheiro, que recebia a Espanha, agora vai para os bolsos não do Marrocos, mas do rei do Marrocos.


Qual foi a característica da colonização espanhola? Foi igual ao do resto do continente, de exploração de recursos naturais?


Na realidade, desde que a Espanha começou a ocupação do Saara Ocidental, em 1882, nunca fez nada. Aproveitava a costa saarauí para ter bases para os barcos de pesca. Não tinha outra importância, até que descobriram a presença das jazidas de fosfato. Aí, o governo espanhol fez um investimento muito grande. Todo um complexo minerador que implicava extração, transporte e carregamento dos navios. Tudo aquilo começava a dar lucros para o governo da Espanha, porque era uma companhia do Estado espanhol, mas aí começou a invasão marroquina. As instalações foram construídas para extrair até 10 milhões de toneladas por ano. No primeiro ano, o governo espanhol exportou dois milhões, no segundo ano, cinco milhões, e no terceiro, acabou, porque começou a guerra. Portanto, quem está aproveitando agora é o Marrocos. Aproveitando as próprias instalações espanholas. Eles exploram os minérios e os direitos de pesca.


Exportam para quem?


Para muitos países. No Marrocos, também há jazidas. Só que, claro, quando você tem as principais jazidas do mundo, você se converte em monopolista, e pode impor preços no mercado internacional. Isso é o que está fazendo o Marrocos, pois a companhia que explora é do Estado. Na verdade, não é do Estado, é do rei. O rei é o principal acionista da companhia estatal. Estamos falando diretamente da riqueza do rei.


O senhor disse que os soldados que participaram da invasão marroquina vinham também com bandeira estadunidense.


Foi uma coisa muito esquisita. Quem autorizou o começo da operação, da Marcha Verde, foi Henry Kissinger [ex-secretário de Estado dos EUA]. Tudo isso foi feito em cumplicidade com o governo norte-americano.


Desde então a monarquia marroquina já era aliada dos EUA?


Sim. Os EUA têm interesses estratégicos no Marrocos. Porque é a zona de confluência da 6ª Frota, do Mediterrâneo, e da 2ª Frota, do Norte do Atlântico. Portanto, o Marrocos era uma peça importante no esquema de dominação geoestratégica dos EUA. O Marrocos de um lado, o Egito do outro, e a África do Sul lá no sul. Era o Triângulo das Bermudas.


Então a invasão do Saara Ocidental foi de interesse dos EUA.


Foi tudo cozinhado entre a monarquia marroquina, os EUA e a França. Naquele tempo, neste último, já estava o Valéry Giscard d'Estaing, de direita. A França tem também interesses muito fortes na região.


Quais são?


A França é a ex-potência colonial. Marrocos, Tunísia, Argélia, Mali, Senegal. No meio daquele oceano francófono, está o Saara Ocidental hispanófono. A França foi embora, politicamente, mas economicamente, ficou. O domínio continuou. Esses interesses neocoloniais amarravam os interesses da burguesia, do feudalismo marroquino, com os do imperialismo francês. E estava em jogo aquele prestígio da França. “Aqui mando eu”. Por isso que sempre foi o aliado principal do Marrocos. E é até agora. Além disso, havia os interesses econômicos.


Desde 1975, quando começou a invasão marroquina, como evoluiu a resistência saarauí?


A Espanha vai embora numa operação que culmina em 27 de fevereiro de 1976, dia em que sua bandeira é arriada pela última vez. Nesse mesmo dia, no interior do deserto, a Frente Polisario proclama a República Democrática Saarauí [RASD], para que não houvesse nenhum vácuo jurídico que pudesse ser aproveitado pelos novos ocupantes. Imediatamente, essa república jovem, recém-nascida, já é reconhecida por sete países da África. A primeira tarefa da nova república: salvar a vida da população civil, que estava ameaçada de genocídio pelas tropas marroquinas. Entraram matando, acabando com tudo. Bombardeios de napalm, de fósforo branco. Todos aqueles que puderam, fugiram para o interior do deserto, para os acampamentos da Frente Polisario, procurando proteção. E a aviação marroquina os bombardeava. Teve um acampamento desgraçadamente famoso em Um Draiga que foi bombardeado por três dias seguidos. Mataram 2.500 pessoas. Imagina quantos desapareceram. A verdade é que houve um perigo real de extermínio da população. Então a Frente Polisario fazia um combate ferrenho para impedir o avanço das tropas marroquinas. Ao mesmo tempo, evacuava a população civil rumo à Argélia. O presidente argelino, Houari Boumédiène [1965-1978], abriu a fronteira, e aí foi a salvação da população civil. Hoje, os acampamentos estão no mesmo lugar. É o ponto mais extremo do Deserto de Saara. No inverno, atinge a temperatura de quase 0ºC. No verão, ao meio-dia, 60ºC. Você percorre a região inteira de carro e encontra um arbusto, outro a cinco quilômetros, outro a dez quilômetros. Só isso! O resto é areia, pedra, areia, pedra. No meio do nada, eles montaram os acampamentos para sobreviver. Então, o Exército Saarauí, uma vez que culminou a etapa de resgate da população civil, passou a uma fase de ofensiva. E assim foi de 1976 a 1991. Quinze anos depois, a partir das negociações promovidas pelas Nações Unidas e a OUA [Organização da Unidade Africana], chegou-se a assinar o acordo de cessar-fogo. Na guerra, as Forças Armadas Saarauís não puderam expulsar os marroquinos. Mas estes tampouco puderam acabar com os saarauís. Quando as tropas da ONU entraram, tinha, do lado saarauí, 15 mil combatentes. Do lado marroquino, 165 mil homens, armados pelo melhor armamento da África do Sul, França, Espanha e EUA. Em 1980, o exército marroquino ficou quase encurralado pelos ataques do Exército Popular Saarauí. Aí, com a ajuda diplomática, política e financeira dos EUA, e de Israel, construíram os muros fortificados para evitar os ataques do Exército Popular Saarauí. Começaram a construir um muro em torno da região das jazidas. Depois fizeram outros. Hoje tem um muro que vai do norte até o sul, são mais de 2.500 quilômetros. Tem 150 mil soldados permanentemente deslocados ao longo do muro, que está precedido por campos minados, por campos de arames farpados. Eles têm sistemas de radares que detectam os movimentos de uma pessoa a 10 quilômetros de distância. A cada cinco quilômetros, há uma posição de infantaria. A cada dez quilômetros, uma posição de artilharia pesada. Detrás do muro, estão as bases dos blindados. E, por cima de tudo isso, há a aviação, continuamente patrulhando. Estima-se que isso está custando ao Estado de Marrocos, em média, 4 ou 5 milhões de dólares por dia.



Provavelmente, com a ajuda financeira dos EUA, França...


Logicamente. E mais: os saarauís falam “por que o Marrocos é subdesenvolvido?”. Precisamente porque o dinheiro que podiam empregar no seu desenvolvimento estão empregando em gastos militares. Então, aquela divisão do deserto pelo muro, paras os saarauís, foi um choque, o deserto parecia livre, mas, de repente... uma muralha. As negociações procurando um acordo político deram como resultado o cessar-fogo que entrou em vigor em setembro de 1991. Com uma condição fundamental: que, em poucos meses, fosse realizado um plebiscito para que a população saarauí pudesse manifestar sua vontade a respeito de seu futuro político, sem pressões de nenhum tipo, livremente, tudo isso controlado pelas Nações Unidas. Escolher entre ser livres, independentes, ou ser parte do reino de Marrocos. Acontece que desde então, o reino de Marrocos tem se dedicado a sabotar, a por empecilhos diversos, para impedir a realização do referendo. Hoje já falam: “referendo não, isso é nosso, não tem discussão. Poderemos dar no máximo, uma autonomia”. Como se fosse uma província autônoma, mas sob a soberania do Marrocos. Já nem aceitam o referendo. Os saarauís dizem que aquele acordo que propiciou o fim da guerra tem sido violentado, e que, portanto, a guerra pode voltar. Essa é a situação hoje.


Esse conflito se deu na época da Guerra Fria. Houve um apoio, para a Frente Polisario, por parte da União Soviética, de Cuba etc?


Da União Soviética nunca. De Cuba sim. Desde o início da proclamação da República, Cuba apoiou de uma forma só: admitindo, no seu território, estudantes saarauís. Hoje, já passaram, por Cuba, milhares de saarauís. São médicos, engenheiros. São chamados de “cubaarauís”.


Por que o senhor acha que a União Soviética não interveio?


Na minha opinião, porque tinha um bom comércio com o Marrocos. Eram pragmáticos. Nunca deram nada, nem um pedaço de pão. Nem sequer o reconhecimento político. Os únicos países da Europa que reconheceram politicamente e diplomaticamente a República Saarauí foram a Iugoslávia, que não existe mais, e a Albânia, que mudou totalmente. Só. Mas do resto do bloco socialista europeu, nenhum deles. A ajuda militar veio da Argélia e, fundamentalmente, depois, havia os armamentos que eram pegos dos marroquinos. Nos acampamentos, há um museu militar, uma pequena mostra do que os saarauís capturaram. Tanques sul-africanos, norte-americanos, canhões auto-propulsados franceses, caminhões franco-germanos, metralhadoras, armamentos ligeiros e morteiros espanhóis.



Nesses acordos de 1991, além da realização do referendo, quais eram as bases dele?


O referendo era o principal. Primeiro, entrariam os cascos azuis e uma força multinacional de polícia, para preparar o terreno para a realização do referendo. Outro ponto era o transporte, por parte da ONU, dos refugiados para o território saarauí. Três meses após os acordos, iriam realizar o referendo. Ou seja, iria ser em janeiro de 1992.


E por que não foi realizado?


Nesses mesmos dias, o rei Hassan II falou: “espera aí, eu tenho aqui uma lista de saarauís que não estão contemplados no censo espanhol”. Porque a base do padrão eleitoral seria o censo espanhol, que contava 74 mil saarauís. O rei tirou uma lista de 120 mil. Imagina, numa população com 74 mil eleitores, e você põe 120 mil a mais. Eram os saarauís nascidos em Marrocos, que teriam direito a votar também. A Frente Polisario nunca aceitou. Nem a ONU. Ninguém aceitou. Mas, com isso, o rei bloqueou o referendo. Então, tiveram que fazer uma depuração e chegaram à conclusão que só 10 mil tinham direito. Aí, o Marrocos não aceitou. Então, inventaram outra coisa. E assim foi passando o tempo. Por que o Marrocos faz isso? Porque tem o respaldo da França. E a França tem veto no Conselho de Segurança da ONU.


Qual a população do Saara Ocidental hoje?


Aproximadamente 300 mil pessoas. Entre os que estão nos acampamentos, nos territórios ocupados, e os dispersos pelo mundo. Nos acampamentos, são 180 mil. Nos territórios ocupados, uns 90 mil. Só que os marroquinos enfiaram colonos... a mesma política de Israel. Além dos 165 mil soldados, tem todo o aparelho de administração colonial. E além disso, enfiaram 120 mil colonos. Ou seja, hoje a população saarauí é minoria dentro dos territórios ocupados. Então, a impaciência chega, e, por não poderem, por enquanto, optar pela via armada, começaram, em 2005, uma rebelião pacífica, a Intifada Saarauí. Nos acampamentos, estão desejando começar a guerra de novo.


Esse foi um movimento espontâneo ou foi impulsionado pela Frente Polisario?


Foi uma mistura. Começou em maio de 2005. Até hoje, não tem parado em nenhum momento. São quatro anos de rebelião pacífica. Por enquanto, os saarauís não deram nem um tiro. No máximo, são pedras. Mas a repressão é muito grande. Neste momento, tem presos políticos em greve de fome há 30, 40 dias. Reclamando melhores condições na prisão. Mas, desde maio de 2005, desapareceram 15, e morreram quatro ou cinco. E milhares passaram pela prisão e pela tortura. Espancados nas ruas, também milhares. Homens e mulheres. Continuamente. O presidente saarauí está pedindo para a ONU para que esta cuide dos direitos humanos da população que está nos territórios ocupados. O tema foi levado ao Conselho de Segurança este ano, e foi até defendido pelo embaixador norte-americano. Pela primeira vez. Quem ficou sozinha foi a França. Ficou em evidência perante o mundo inteiro que só eles não permitem que a ONU cuide dos direitos humanos da população saarauí. Mas, pela primeira vez, o governo norte-americano assume uma posição diferente da de anteriores governos. Então, estamos numa fase promissora, porque, por um lado, a Intifada continua. Por outro lado, a Anistia Internacional, a Human Rights Watch, o Parlamento Europeu, têm emitido relatórios denunciando a violação permanente dos direitos humanos e pedindo à ONU que tomem conta disso. Por outro lado, o lobby pró-Saara Ocidental tem um peso que antes não tinha sobre o governo norte-americano. Antes, só os marroquinos, sobretudo com o Bush. O que está pedindo o governo saarauí? Uma coisa só: vamos fazer o referendo. Por que eles não fazem? Têm medo, porque a população saarauí quer ser independente. E tem uma coisa interessante. Os protagonistas da Intifada são os jovens saarauís. Mas os jovens que já nasceram nos territórios ocupados. Coisa que o Marrocos não conseguiu ganhar, sequer ideologicamente, foi a juventude. E mais: há filhos de colonos marroquinos que, por terem nascido no Sarra Ocidental, se sentem saarauís. Essa é uma derrota política muito forte para a monarquia. Ela se mantém somente na base da ocupação das Forças Armadas e do aparelho de repressão.


O senhor falou de governo saarauí. Foi o governo instituído pela Frente Polisario, não é?


O governo saarauí por enquanto é de partido único, o partido da Frente Polisario. Mas esse partido tem uma existência condicionada à independência. O dia em que a República for totalmente soberana, que tiver o domínio sobre todo o território, automaticamente a Frente Polisario fica dissolvida e daí nascerão x partidos. É um acordo das forças políticas saarauís de combater todos juntos sob uma só bandeira, a da independência. São por definição, religiosos. Sunitas. Mas bastante liberais. É uma República comum e corrente, tem Poder Executivo, Legislativo e Judiciário.


Que não são reconhecidos internacionalmente.


Hoje, a República Saarauí é reconhecida por 82 países. Em toda a América Latina, só faltam três países para darem seu reconhecimento: Brasil, Argentina e Chile. O primeiro foi o Panamá, em 1978. Tem embaixada em Havana, Caracas, Cidade do México e Cidade do Panamá.


Como é a população saarauí hoje? Do que ela vive, quais suas características etc?


A população saarauí que está há 33 anos nos acampamentos no sul da Argélia sobrevive graças a duas coisas. A sua determinação de sobreviver, e à solidariedade internacional. Dos organismos humanitários, da União Europeia, toda ajuda do governo argelino, e muita ajuda do povo espanhol. Porque embora o Executivo esteja totalmente a favor do Marrocos, a população espanhola está com os saarauís. No nível municipal, autonômico, estão com os saarauís. Concretamente, o Zapatero [José Luis, presidente da Espanha] e o chanceler Moratinos [Miguel Ángel] têm se inclinado a favor da monarquia marroquina. Têm até dado de presente armamento.


Por quê?


Eu gostaria de saber. Deve ter interesses econômicos muito fortes de empresas espanholas no Marrocos para a exploração de diversos setores, turismo, minérios... interesses da monarquia espanhola... e deve ter alguns interesses pessoais de alguns políticos espanhóis, quem sabe o que.
Como é a economia do Saara Ocidental?


Lá nos acampamentos tem manufaturas artesanais, algumas hortas, uma agricultura muito precária. Imagine, no meio do deserto.


E a população dos territórios ocupados, como vivem?


Sobrevivem, não sei como, porque são discriminados. Eles trabalham nas coisas que foi pondo lá a indústria extratora das jazidas de fosfato, trabalham na pesca, mas sempre são de quinta categoria. Se têm algum problema, são demitidos imediatamente.


No Saara Ocidental, nessa região, existem empresas francesas, espanholas, estadunidenses...


De todos os lugares. Porque, para piorar, há quatro, cinco anos, descobriram que tem petróleo e gás natural. Há uma campanha mundial das organizações progressistas para impedir a exploração dos recursos naturais saarauís. Já obrigaram empresas norueguesas, australianas a se retirarem, sob argumentos éticos. Na realidade, segundo o direito internacional, ninguém pode tirar, porque é um território ocupado. Mas tem empresas espanholas, que exploram a pesca...


Que negociam diretamente com o Marrocos.


Claro. E tem outras nacionalidades, explorando minérios, pesca. E agora, querem morder o petróleo também. Voltando, a Frente Polisario falou: “se nós fizermos o referendo, vamos ganhar. E se ganharmos, os colonos marroquinos podem ficar. Não vão ser nem expulsos, nem discriminados”. E eles cumprem. Os saarauís são muito direitos nesse sentido. Eles têm um sentido de hospitalidade impressionante. Claro, é cultural do deserto. É a garantia de sobrevivência.


Tem alguma coisa que o senhor gostaria de acrescentar?


A importância que hoje teria um reconhecimento por parte do Brasil. O peso internacional é grande. No fim das contas, estamos falando de um governo de esquerda. Um governo de esquerda deve ter determinados princípios que guiem sua atuação internacional. Já são 28 países na América Latina que reconhecem o Saara Ocidental. O Brasil fala que tem uma política de neutralidade, mas não é verdade. Porque quando você tem um forte que agride e uma vítima que é agredida, e você tem relações com o forte, e não tem com a vítima, então isso não é neutralidade. O Brasil tem embaixada marroquina em Brasília. Por que não tem a embaixada saarauí? Um dirigente de esquerda não pode ser neutro. Você tem que estar sempre do lado da vítima da injustiça. Eu acho que um governo de esquerda no Brasil deveria adotar medidas similares. Não estaria fazendo nenhum ato vanguardista. Mas seria muito importante. Porque quanto mais pesar na balança internacional o reconhecimento a favor da República Saarauí, menos probabilidades haverá de estourar novamente uma guerra. Mas se o povo saarauí for condenado a não ter outra saída que não seja a guerra, vai correr sangue de novo.

domingo, 28 de junho de 2009

MAUS TRATOS A PALESTINOS NO LÍBANO

EXCLUSIVO DO ICARABE

23/6/2009


Campos de refugiados
Human Rights Watch denuncia maus tratos a palestinos no Líbano

Campo de Nahr El Bared, no Líbano, em 1948


“Os refugiados palestinos que vivem no Líbano têm as piores condições de vida de todo o Oriente Médio”, afirma Nadim Houry, analista sênior da Human Rights Watch (HRW) para a Síria e Líbano. A ONG abriu no final do ano passado seu primeiro escritório na região, reconhecida internacionalmente pelos frequentes casos de violações aos direitos humanos.Atualmente, cerca de 410.000 refugiados palestinos moram no Líbano, segundo dados da UNRWA (agência da ONU especialmente criada para cuidar do problema). A soma equivale a 10% da população total libanesa e a maior parte dos refugiados vive no país desde 1948, após a primeira invasão de Israel nos territórios palestinos.Apesar do número representativo, os palestinos enfrentam há mais de 60 anos condições de vida precárias no Líbano. Não possuem cidadania ou direitos civis e têm acesso limitado a serviços públicos de saúde e educação. A maioria depende completamente do atendimento da UNRWA, que possui 87 escolas e 25 postos de saúde, espalhados pelos 12 campos de refugiados que existem no país. O mesmo não acontece no restante do mundo árabe. “Na Síria, a situação dos direitos humanos em geral é terrível, mas o governo tem sido generoso com os refugiados palestinos como forma de aumentar sua influência na região e, na Jordânia, eles têm plenos direitos e são cidadãos de primeira classe”, explica Houry. Antes de se tornar pesquisador na HRW, o advogado foi membro da investigação da ONU sobre o Programa “Oil-for-Food” (Petróleo por Alimentos) – estabelecido em 1995 para permitir que o Iraque vendesse petróleo no mercado internacional em troca de itens de necessidade básica e que foi alvo de escândalos de corrupção após ser desmantelado em 2003.Sub-emprego“Os refugiados palestinos são considerados estrangeiros e estão proibidos por lei de trabalharem em 20 ramos diferentes de profissões. No Líbano, vigora uma norma de reciprocidade para atuação profissional, então, médicos italianos, por exemplo, podem trabalhar no país, se libaneses puderem trabalhar na Itália também. Mas os palestinos não possuem Estado e por isso ficam à margem do mercado de trabalho”, diz Houry.Na prática, a procura de emprego no mercado informal prevalece como alternativa para os refugiados palestinos. “Por conta das proibições, eles acabam buscando sub-empregos, trabalham como pedreiros e faxineiros e ganham muito abaixo do piso salarial”, explica Benjamin Schuetze, estudante universitário alemão em intercâmbio com a Universidade Americana de Beirute (AUB na sigla em inglês). Ele ensinou inglês para palestinos como voluntário durante os últimos seis meses no campo de refugiados de Chatila, em Beirute. Em 1982, o local foi alvo de um ataque de forças cristãs falangistas durante invasão de Israel no Líbano que resultou em mais de 2.000 mortos, a maioria composta por civis, mulheres e crianças. No mesmo ano, a Assembleia Geral da ONU reconheceu o episódio como genocídio. Cena políticaPassados 27 anos, a situação dos campos permanece caótica. “Os cortes de luz são constantes, falta água, não há rua asfaltada e os jovens estão desempregados”, conta Schuetze. Desde 2005, o governo do Líbano instalou um Comitê de Diálogo Libanês-Palestino (LPDC, na sigla em inglês) para promover a melhoria das condições de vida dos refugiados, sem resultados efetivos ainda.O problema foi abordado em recente relatório do centro de pesquisas International Crisis Group como uma das maiores violações dos direitos humanos no Líbano. “Hoje a questão dos refugiados está intrinsecamente relacionada às divisões sectárias libanesas. Os palestinos são em sua maioria muçulmanos sunitas e há o temor de que desequilibrem o cenário político do país se forem naturalizados”, afirma o documento intitulado “Cultivando a instabilidade: campos de refugiados palestinos no Líbano”.No dia 7 de junho, o Líbano realizou eleições parlamentares, reconhecidas como pacíficas e idôneas por mais de 200 observadores internacionais. É a primeira vez que o pleito acontece em um dia, em vez de se prolongar por três fins de semana, como de costume. O cenário de tranquilidade deveu-se, sobretudo, à vitória da coalizão governista sobre a aliança liderada pelo grupo xiita Hezbollah. Desde o assassinato do primeiro-ministro Rafik Hariri em 2005, o Líbano enfrenta frequentes crises políticas e o receio de outra Guerra Civil (1975-90) é uma constante no país dividido entre grupos políticos cristãos, xiitas, sunitas e drusos.


__________________________
Por Carolina Montenegro, em Beirute*

sábado, 27 de junho de 2009

PARAGUAI PRENDE HOMEM FORTE DA OPERAÇÃO CONDOR

Nós brasileiros temos o hábito de falar mal dos nossos irmãos paraguaios. Para nós, eles seriam "um povo guarani subdesenvolvido". A história deles não é bem assim. E constantemente nos equivocamos com esses estereótipos. O Paraguai já foi a maior economia e também já teve a maior força militar do continente. Eram uma potência e só o deixaram de ser graças à atuação brasileira em prol dos interesses ingleses. É, nós invejavamos a capacidade daquele povo.
Achamos que aquele pequeno país não é uma democracia séria. Hummmm. Acho que o nosso país grande é que não é uma democracia assim tão séria. Vejam bem: lá eles prenderam nessa semana um alto dirigente político acusado de tortura e outras atrocidades durante o regime militar. Aqui não há um torturador daquela época preso. Veja a matéria publicada no Jornal Brasil de Fato (clique aqui para ler na página original).

Ex-ministro da ditadura é levado à prisão

Montanaro, ministro do Interior durante a ditadura de Stroessner, recebeu nesta quarta-feira (24) o destino desejado por familiares de vítimas da repressão: a penitenciária de Tacumbú, localizada em Asunción

foto: Alertnet
26/06/2009
Daniel Cassol, Paraguai


Aos 86 anos, Sabino Augusto Montanaro, ministro do Interior entre os anos de 1967 e 1989 da ditadura de Alfredo Stroessner, recebeu nesta quarta-feira (24) o destino desejado por familiares de vítimas da repressão desde sua chegada ao país: a penitenciária de Tacumbú, localizada em Asunción. A Corte Suprema de Justiça, no entanto, deve decidir hoje se concede ou não habeas corpus ao “homem forte” do ditador Stroessner.


Exilado em Honduras desde 1989, Montanaro voltou ao Paraguai no dia 1º de maio deste ano, provocando uma série de mobilizações para a sua condenação. Nos últimos dias, após receber alta do hospital, sua casa na região central de Asunción teve as grades cobertas com tapumes e passou a ser vigiada por seguranças privados, reforçando suspeitas de que ele iria ser deslocado para sua residência.

Nesta quarta-feira, porém, Montanaro foi preso preventivamente na penitenciária de Tacumbú. Os diretores da instituição penitenciária prometem não dar privilégios ao preso número 3.073, que chegou ao local sobre os gritos de “assassino” por familiares de vítimas da ditadura, que exigiam sua prisão desde sua chegada ao país.
“A presença de Montanaro em Tacumbú está encerrando em muitos uma etapa de dor, reiniciando esta pátria que sonhamos, sem perseguições, exílios, torturas e muito menos ditaduras”, afirmou ao jornal Última Hora a vereadora Rocío Casco, presidente do Partido do Movimento ao Socialismo (P-Mas).
Montanaro era considerado o homem forte da ditadura de Stroessner, encarregado de ordenar e executar prisões, torturas e mortes. Ele é acusado de cometer crimes de lesa-humanidade e de ter participado da Operação Condor, sistema de repressão articulada entre os países do Conesul.
A Corte Suprema de Justiça do Paraguai deve decidir se concede ou não o habeas corpus a Montanaro, baseando-se na lei que impede a prisão preventiva de pessoas maiores de 70 anos. Familiares das vítimas da ditadura sustentam que os crimes cometidos por Montanaro são imprescritíveis.

sexta-feira, 26 de junho de 2009

UMA CHANCE PARA A CIDADANIA

Li uma importante matéria sobre analfabetismo na revista CARTA CAPITAL dessa semana (clique aqui para ler uma breve introdução) e me assustei com o número de analfabetos absolutos: mais de 14 milhões de brasileiros. Desses, 9 milhões vivem nas cidades, dos quais mais de 3 milhões nas grandes metrópoles. Os 5 milhões restantes residem no campo.
Esses brasileiros esquecidos pelos governos formam um contigente de 7,5% da população brasileira, um número absurdamente alto.
Agora, qual o incentivo que esses excluídos da educação básica têm para ler? Será que o itinerário do ônibus, o próprio nome e o dos políticos nas urnas eletrônicas são suficientes para fomentar a vontade de aprender a ler e tornar-se mais próximo da cidadania? Me parece que não. Falta estímulo. Eles não têm acesso a revistas, livros e jornais gratuitos, salvo em algumas estações de metrô.
Por esse e outros motivos mantive quase que em segredo absoluto um sonho antigo, o de fazer um jornal gratuito para a periferia, para as classes "D" e "E" da grande S. Paulo. Mas o projeto, embora tenha consumido tempo, dedicação e vontade de que desse certo, não foi adiante por um simples motivo: falta de dinheiro.
Para testar a idéia montei uma página jornalística, o JP - Jornal da Pompéia. A grande parte dos colaboradores desse projeto se dedicava a informar o público com presteza e atenção. Foram grandes companheiros do início da empreitada. Mas não deu certo. A tão almejada cidadania, pano de fundo da página virtual e do jornal, foi praticamente esquecida e percebi que o projeto era muito grande e dispendioso para uma pessoa que não reunia tanto capital e ainda tinha a saúde relativamente debilitada. Desisti, não sem pesar.
Mas coloco aqui um pouco do sonho que pode parecer megalomaníaco, mas que visava atingir o direito de todos, sem preconceito e distinção, à informação para a cidadania e os direitos humanos. Foi um sonho colorido, daqueles que não nos esquecemos, que não deu certo, infelizmente. Na verdade o projeto alcançava 1 milhão de exemplares e não 2,5 milhões como constou no vídeo abaixo. Aí já seria megalomaníaco demais, superando a loucura dos que se acham Jesus Cristo, Júlio César, Cleópatra ou Napoleão Bonaparte.
Seria uma oportunidade dos mais pobres terem acesso à leitura, recebendo o jornal na porta de casa, com dignidade. Esse 1 milhão de exemplares alcançaria 5 milhões de brasileiros da periferia. Mas mesmo não dando certo, não deixo de acreditar que podemos fazer muito pela cidadania, individual ou coletivamente. Continuemos na luta.
Viaje comigo nessa idéia no vídeo abaixo.

quinta-feira, 25 de junho de 2009

Meninas na rota da prostituição

A Tribuna Digital - Baixada Santista - 21 de junho de 2009
____________________
Enviada ao Vale do Ribeira
____________________
Os mais desavisados passam e nem percebem. Em alta velocidade, carros, ônibus e caminhões as transformam apenas em vultos. No entanto, basta tirar o pé do acelerador para perceber que essas imagens, antes borradas, ganham vida e viram protagonistas de uma história que traz como enredo principal a degradação.
A exploração sexual infantojuvenil não dá tréguas e deixa suas tristes marcas pelas rodovias do País. Na Régis Bittencourt, A BR-116, que liga São Paulo ao Paraná, não é diferente. Por míseros trocados, crianças e adolescentes vendem o corpo. Ficam paradas nos postos, entre os caminhões, ou no acostamento.
Como estava Fernanda (nome fictício), próximo ao Km 372, altura do município de Miracatu. Ao ver um carro parado do outro lado da pista, atravessou correndo. "Cobro R$ 10,00". O olhar parado, quase perdido, denunciava que a menina estava sob efeito de drogas. "Tenho 17 anos". Não aparentava mais do que 15.
Fazia muito frio naquela noite de quarta-feira. Magrinha e baixinha, usava minissaia, camiseta, uma jaqueta fina e uma touca. Nos pés, chinelos. Fernanda é nova de idade mas experiente quando o assunto é estrada. "Estou aqui desde os 12". A inocência perdida no dia a dia de uma vida sem perspectivas fica clara quando a jovem explica ao que o cliente terá direito se topar o programa. "Uma chupetinha e uma transada".
Fernanda podia ser sua irmã caçula, sua sobrinha, sua filha. Fernanda deveria ter direito a uma vida de sonhos. Só que não. Por razões tão diversas quanto injustas, tornou-se vítima de um crime. Porque quem paga para fazer sexo com ela está sujeito a sofrer punições, como prevê o artigo 244A do Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA). Pena de 4 a 10 anos de reclusão "a todo aquele que submeter a criança e o adolescente à prática sexual".
Um detalhe estarrecedor: Fernanda não se reconhece como vítima. "Não tem perigo, já estou acostumada".
Nesse universo repugnante ela está longe de ser a única. Mapeamento feito em 2007 pela Polícia Rodoviária Federal com a Organização Internacional do Trabalho (OIT) nas rodovias federais e publicado no ano passado mostra um número impressionante: 1.819 pontos de vulnerabilidade relacionados à exploração sexual infanto-juvenil. Só no Estado de São Paulo são mais de 400.
No Vale do Ribeira, justamente às margens da Régis Bittencourt, foram destacados 44. São bares, postos de combustíveis, motéis, restaurantes, boates que ficam em áreas urbanas ou rurais, seja na beira da estrada ou dentro das comunidades de cidades como Miracatu, Juquiá, Registro, Jacupiranga, Cajati.
PACTO DO SILÊNCIO
E foi em Jacupiranga, exata- mente num desses lugares apontados pelo levantamento, Km 479, que a equipe de A Tribuna flagrou, em dois momentos de um mesmo dia, ce- nas com indícios de comércio sexual infantil. Na primeira, à tarde, uma menina, ao ver três caminhões chegando, correu para o pátio. Depois de alguns minutos e uma rápida conversa, se encaminhou para a lanchonete com os motoristas. No início da madrugada, eram duas. Uma, parada em frente a um veículo. A outra, conversando com um caminhoneiro.
Ao contrário do que aconteceu com Fernanda, foi impossível qualquer tipo de aproximação com essas jovens. No posto de combustível desativado, existe um amplo espaço, que funciona como estacionamento para caminhões. Fica a uns 200 metros do restaurante, de uma farmácia e dos sanitários. Ao lado, existe uma espécie de oficina. Apesar disso, o movimento ali era fraco. De acordo com o balconista da farmácia, há pelo menos três anos o local deixou de vender combustível.
O fato de estarmos com um carro sem a identificação de imprensa não foi o suficiente para passarmos despercebidos nas duas vezes em que estivemos no posto.
Sob olhares desconfiados dos funcionários do tal restaurante e farmácia, era arriscado tocar no assunto com estranhos. Em muitas situações, como confirmouAnália Belisa Ribeiro, coordenadora do Núcleo de Enfrentamento ao Tráfico de Pessoas da Secretaria de Justiça e Cidadania do Estado de São Paulo (Sejuc), o aliciador está por perto dessa adolescente. "O dinheiro que ela ganha é dividido, no mínimo, por três: para ela, família e aliciador".
Portanto, a máquina do repórter fotográfico Davi Ribeiro permaneceu dentro do veículo e, sem usar o flash, ele teve de recorrer à luz que saía do farol para capturar as imagens e contar com a habilidade do motorista Clineu Ferreira Júnior, que precisava ser rápido para não despertar (ainda) mais a atenção.
Ao longo de mais de mil quilômetros que rodamos durante o final de semana e numa quarta-feira à noite, pela Régis Bittencourt em diferentes horários, estivemos em diversos desses pontos marcados. Não é fácil encontrar alguém disposto a falar ou a comentar a questão da exploração sexual infantil. Sob o pacto do silêncio, poucos se dispõem a conversar. "Eu sei que aqui não tem", desconversa um frentista de um posto de marca famosa.
QUESTÃO DE ESTRUTURA
O que acontece, então, é que essas jovens em situação de risco vão para locais que podemos chamar, tranquilamente, de facilitadores para esse tipo de crime. São postos, estacionamentos e oficinas mecânicas que viram alvo da prostituição por conta do aspecto de abandono. Aquele mesmo funcionário desconfiado do ponto vulnerável da região da Jacupiranga fez uma espécie de radiografia. "Nos postos maiores os caminhões são cadastrados pelas empresas para que os motoristas possam passar a noite. Nos outros, estaciona quem quer". Isso fica evidente quando se observam as diferenças estruturais. Iluminados, com instalações para banhos, restaurantes melhores.
A presença de seguranças particulares também inibe a prática criminosa. Muitos profissionais acabam sendo atraídos por essa sensação de proteção transmitida por esses lugares, que ficam, realmente, lotados durante a madrugada. Bem diferente dosoutros cenários. "Prefiro os postos grandes, mas hoje cheguei tarde e tive que parar aqui. Fico de olho e longe dessas meninas", relata um caminhoneiro de Bagé, no Rio Grande do Sul. "Elas chegam e se oferecem", afirma ao lado do seu veículo, parado em um estacionamento escuro, sem qualquer infraestrutura.
De Carlos da Nóbrega, também no Rio Grande do Sul, outro motorista de carga fala: "Onde tem essas meninas tem ladrão, roubo de carga, assalto. Eu não paro".
Não bastassem vítimas, muitas delas são usadas como instrumentos para práticas criminosas. "Existe um associação muito grande com o tráfico de drogas e a questão do roubo de carga. E a própria família estimula a permanência dela para poder ter um resultado financeiro melhor", confirma Anália.
SONHO INTERROMPIDO
Não é fácil retomar uma vida cuja base está longe de ser sólida. Por isso, muitas meninas, mesmo quando retiradas da prostituição, acabam voltando. "Essa menina não vê horizonte. Qual é o seu sonho? Muitas não têm sonho. A visão é limitada com o dia de amanhã", lamenta Yuri Giuseppe Castiglione, promotor de Justiça da Infância e Juventude e integrante do grupo de enfrentamento ao tráfico de seres humanos e exploração sexual de crianças e adolescentes do Ministério Público do Estado de São Paulo.
Conselheiro tutelar em Miracatu, João Batista Tosta conhece bem essa realidade. Tanto que ao ser informado sobre o caso de Fernanda, a jovem do início dessa matéria, contou sua lamentável história. A menina quando foi abordada pela equipe de A Tribuna revelou seu nome verdadeiro já foi retirada da beira da estrada dez vezes (isso mesmo). Seu último recolhimento aconteceu no dia 30 de maio, sendo encaminhada para a promotoria da infância e juventude de Registro, seu município de origem. "Ela é usuária de drogas e já fugiu de uma clínica. Possui um histórico bem complicado, não tem família e tinha um senhor que a ajudava. De vez em quando, pede ajuda, comida, roupas, porque chega em um estado lastimável", informa o conselheiro tutelar.
João confirma sua idade: 15 anos. "Ela nos relatou fazer programas por R$ 1,00 para comprar drogas. Certa vez, foi jogada, com o caminhão em movimento, para a estrada. Ficou toda machucada e precisou ser internada".
No caso dessas jovens, especificamente, o fato de ser vítima acaba atrapalhando e dificultando que ela receba ajuda. "Ela não é autora de um ato infracional. Se fosse, o juiz poderia determinar sua internação em um estabelecimento adequado. Na verdade ela é a vítima, e a forma de abordagem, as medidas legais existentes para o tratamento da vítima são aplicação de medidas protetivas. Acompanhamento psicológico e da família para buscar conscientizar. A grande dificuldade é situação de miserabilidade".
A lista de apoios a que essa adolescente teria de contar para não interromper sua juventude é grande: família, políticas públicas, educação, emprego, cursos. Não é somente fora de casa que os acessos são limitados. No núcleo familiar, a adolescente encontra sua primeira barreira. "Muitas mães não estão nem aí". É uma situação bem difícil de lidar, relata Ligiane Santana, conselheira Municipal de Jacupiranga.
A coordenadora do Sejuc, Anália Belisa Ribeiro, acredita que a prevenção seja o grande vetor, a grande alavanca para mudança. Claro que aliada à assistência e ao monitoramento dessas vítimas e das famílias. "As famílias são vulneráveis também. Quando a gente fala de família tem que entender que família é essa, que não tem uma estrutura como a que conhecemos".

quarta-feira, 24 de junho de 2009

Agualusa: Brasil deve fazer mais pelo português

16/06/2009

Escritor angolano diz à Rádio ONU que o maior país de língua portuguesa não promove o idioma como deveria; ele participou, nesta terça-feira, de um seminário no Parlamento em Lisboa sobre internacionalização da língua.
(José Eduardo Agualusa)

Mônica Villela Grayley, da Rádio ONU em Nova York.
__________________________
O escritor angolano, José Eduardo Agualusa, afirmou que o Brasil precisa fazer mais para divulgar a língua portuguesa no mundo.
A declaração foi dada à Rádio ONU nesta terça-feira, antes da participação dele num seminário sobre o idioma na Assembleia da República em Lisboa.
Promoção do Idioma
De acordo com o escritor angolano, o Brasil deveria seguir o exemplo de Portugal na difusão da língua. No ano passado, o Parlamento do país aprovou uma política de promoção do idioma no mundo.
A iniciativa foi depois endossada pela Comunidade dos Países de Língua Portuguesa, Cplp. Mas de acordo com Agualusa, o Brasil ainda não se deu conta da relação entre língua e poder político na hora de divulgar o seu próprio idioma.
Traduções
"O Brasil não está a fazer o que Portugal está a fazer, por exemplo. Portugal tem o Instituto Camões cujo objetivo é exatamente o de promover a língua portuguesa no mundo e o Brasil não tem nada equivalente. O Brasil, por exemplo, não dá apoio às traduções de seus autores no estrangeiro. Portugal tem uma política eficiente de apoiar tradução, apoiando inclusive autores africanos também e o Brasil não tem esta política. De vez em quando, a Biblioteca Nacional apoia uma ou outra tradução, mas não há uma política definida. O Brasil tem que fazer isso. O Brasil tem que entender que a cultura traz muito dinheiro ao país. A Música Popular Brasileira hoje está trazendo muito dinheiro ao país através do turismo, por exemplo. A literatura brasileira também. Então o Brasil tem que compreender isso. Tem que compreender que sua afirmação no mundo passa também pela afirmação da língua portuguesa e tem que criar estruturas de promoção da língua e tem que começar a apoiar seus escritores, seus cantores e seus músicos", afirmou.
Comunidade Diplomática
O seminário sobre Internacionalização da Língua Portuguesa reuniu além do autor angolano, representantes da comunidade diplomática, especialistas e os ministros dos Negócios Estrangeiros de Portugal, Luís Amado, e da Cultura, José António Pinto Ribeiro.
O papel do português nas Nações Unidas também foi tema de uma das apresentações realizada pela encarregada da editoria de Português no Centro de Informação da ONU em Bruxelas, Mafalda Tello.


*Foto: Jorge Simão. Site Agualusa.Info

terça-feira, 23 de junho de 2009

Escritora analisa o resultado das eleições no Irã


Em uma entrevista à rede Al Jazeera, a escritora iraniana Azar Nafisi analisa o resultado das eleições no Irã. Para ela, uma parte importante do povo iraniano usou um espaço aberto para expressar o que quer. "Eles votaram não apenas contra Ahmadinejad, mas pelo que defendem. O quadro homogêneo pintado extremamente apresentado, em que a maioria das pessoas no Irã acreditam no islamismo ortodoxo não é verdadeira. O Irã é um país de diferentes minorias étnicas e de diferentes religiões. Muitas das minorias têm sido oprimidas pelo regime", afirma.


Kathleen McCaul - Al Jazeera


Azar Nafisi é mais conhecida como autora do Reading Lolita in Tehran: A Memoir in Books [algo como: “Lendo Lolita em Teerã: uma autobiografia nos livros”], um retrato sempre angustiante de como a Revolução Islâmica no Irã afetou uma professora e seus estudantes. Seu novo livro, Things I've Been Silent About [“Coisas que tenho silenciado”], é um livro de memórias sobre como foi ter crescido contra o pano de fundo da revolução política iraniana.Ela é professora visitante e diretora executiva das Cultural Conversations no Instituto de Política Externa da Faculdade de Estudos Internacionais Avançados da Universidade Johns Hopkins em Washington DC. Nafisi é professora de estética, cultura e literatura, e dá cursos sobre a relação entre cultura e política. A Al Jazeera conversou com ela sobre as recentes eleições no Irã. Al Jazeera – O que acaba de acontecer no Irã?Azar Nafisi – Bem, o que acaba de acontecer no Irã é a continuação do que vem acontecendo há trinta anos. O povo iraniano levantou oposição e usou um espaço aberto para expressar o que quer. Eles votaram não apenas contra [o presidente Mahmoud] Ahmadinejad, mas pelo que defendem. AJ – Mas parece que Ahmadinejad ganhou com uma esmagadora maioria.AN – Mas o mais impressionante é que tanta gente vá às ruas para demonstrar e protestar e tornar seus desejos conhecidos. Isso é ótimo porque desfaz o mito de que no o povo iraniano aprova as leis extremistas sobre eles imposta pelo regime islâmico. Em qualquer sociedade há extremistas. Sempre haverá pessoas apoiando aqueles como Ahmadinejad, assim como muitos estadunidenses apoiaram o Senhor Bush ou os cristãos fundamentalistas. Mas isso não significa que o povo iraniano prefira uma teocracia a um país pluralista com liberdade religiosa e de expressão para todos. Nos seus slogans e pedidos durante as eleições eles queriam liberdade e democracia e repudiaram as leis repressivas. Mas tão importante quanto isso é o fato de que muita gente da elite dominante no Irã estão entendendo que não podem comandar a sociedade do jeito que diziam que podiam. Um bom exemplo é o próprio Senhor Mousavi. Para vencer, Mousavi assumiu alguns slogans progressistas, contra os quais ele já tinha lutado. Eu estava lá no começo da Revolução Islãmica, quando ele foi Primeiro Ministro, e implementou muitas das medidas repressivas que agora denuncia. Eu (assim como muitos outros) saí da universidade que Mousavi ajudou a fechar, como parte da Revolução Cultural. O fato de Mousavi ou Karoobi escolherem falar de liberdade e direitos humanos mostra em que medida o regime está afetado pela resistência do povo iraniano. Eu penso que esses são pontos importantes a respeito das eleições e não apenas quem venceu e quem perdeu.AJ – Mas você não acha que o resultado dessas eleições, a eleição da linha dura de Ahmadinejad contra Mousavi, reformista, sugere que a maioria dos iranianos quer que sua teocracia continue?AN – Para mim, eleições num país como o Irã não tem o mesmo significado que em países como os Estados Unidos. Nós dificilmente temos escolha em quem votar, de qualquer forma. Também não houve um só observador internacional. Um número razoável de pessoas não pode sequer ler no Irã e votará em Ahmadinejad. Eu admito que posso estar enganada, mas para mim o verdadeiro critério de avaliação não é o número de votos. O verdadeiro critério está nas plataformas que os candidatos usam para vencer. Foi realmente impressionante e interessante ver o que Mousavi escolheu como plataforma para ganhar. Ele não fez campanha apenas contra Ahmadinejad, mas contra os próprios fundamentos da República Islãmica. O fato de que Mousavi tenha posto sua carreira política em risco para defender essas posições indica que um número considerável de pessoas não quer o que existe agora. AJ – Então você, enquanto liberal, está otimista com o resultado dessas eleições?AN – Sim, sem dúvida – quer dizer -, não otimista, mas esperançosa. Eu vivi 18 anos com a República Islãmica – nos piores anos. O que me deu esperança foi o modo como essa sociedade não-violenta resistiu ao poder oficial. E não tenho qualquer razão para mudar essa perspectiva. Mas o povo iraniano votou nesse poder oficial – eles votaram na República Islãmica. Agora votaram num presidente ortodoxo. Um dos problemas das revoluções é que são um período de grande agitação mas também de grande confusão. Isso sempre me preocupa. As pessoas estão muito certas do que não querem, mas não muito do que querem. Quando o povo votou pela república islâmica não sabia em quê estava votando. A J – Os resultados dessas eleições pegaram o mundo de surpresa. A mídia internacional fracassou na percepção dos assuntos e sentimentos dos iranianos?AN – Sim! Isso é o que me fascina toda vez que venho aos EUA. Quando eu escrevi sobre os estudantes lendo Lolita em Teerã fui acusada de dizer que a literatura ocidental é maior. Não era isso o que eu estava dizendo. O que eu estava dizendo era que as pessoas no Irã estavam tomando e analisando e vendo esse texto à sua própria maneira – de uma maneira que o Ocidente não faz. O quadro homogêneo pintado extremamente apresentado, em que a maioria das pessoas no Irã acreditam no islamismo ortodoxo não é verdadeira. O Irã é um país de diferentes minorias étnicas e de diferentes religiões. Muitas das minorias têm sido oprimidas pelo regime. Isso não é o islamismo – é um estado usando o Islã para ter poder e nós precisamos acabar com essa mentira. AJ – Você tem falado e escrito sobre a importância da literatura e da cultura na luta pelos direitos humanos e liberdades no Irã e ao redor do mundo, mas será que a arte, a cultura e a literatura serão algum dia mais poderosas que a religião? É suficiente começar uma revolução?AN – Se você observa isso no longo prazo, sim, serão. Eu nunca esqueço que Paul Ricoeur, o filósofo, veio falar no Irã. Ele tinha 80 anos mas foi tratado como Bon Jovi.Em determinada altura, o Ministro para Orientação Islãmica disse a Ricoeur: “Pessoas como nós [políticos] vamos desaparecer, mas vocês, o povo, vai permanecer”. Isso sempre fica na minha lembrança. Nós não lembramos do rei da Pérsia No século XIV; tempo do poeta Hafiz; nós lembramos de Hafiz. AJ – Você trabalha para a Universidade John Hopkins como diretora executiva de conversações culturais. Como essa eleição influenciará as conversações do Irã com o resto do mundo?AN – Parte disso depende do resto do mundo – como escolherá conversar com o Irã. O governo dos EUA é muitas vezes tolo nas suas respostas ao Irã. Para eles, apoiar os direitos humanos se traduz em dar dinheiro a vários grupos e indivíduos e em ter um tratamento hostil com o país. Mas o ponto é não agir por trás de indivíduo algum, mas dar voz ao povo. Shirin Ebadi, a advogada vencedora do Nobel, é alguém cuja confiança no Irã não é posta em questão. A mídia deveria dar-lhe mais espaço do que a Ahmadinejad. Eu penso que Barack Obama deveria reconhecer que o povo iraniano tem uma história, uma cultura e aspirações que diferem do que diz o regime [de Ahmadinejad].AJ – Seu último livro trata de um grupo de mulheres vivendo em Teerã e você tem conduzido muitos workshops para promover a atuação das mulheres na luta pelos direitos humanos e a cultura. O que o resutlado dessas eleições dizem a respeito da mulher hoje?AN- Eu acho que as mulheres do Irã têm se tornado os canários do espírito. Se você quer medir o quanto uma sociedade é livre, observe as suas mulheres. As mulheres iranianas trabalharam verdadeiramente por sua liberdade nessas eleições. Veja a sua campanha pelas assinaturas – elas escolheram uma campanha não-violenta para educar as pessoas dentro e fora do país a respeito das leis repressivas do seu país. Elas desempenharam um papel importante no último século trazendo para a disputa política uma revolução constitutional. No começo deste século, elas jogarão um papel central na mudança da sociedade em direção a sua abertura. Tradução: Katarina Peixoto

segunda-feira, 22 de junho de 2009

IRÃ: ATUALIDADE E ANTIGUIDADE

Hoje o Irã vive graves confrontos entre estudantes e policiais e entre estudantes e paramilitares. Aqueles que inicialmente foram os grandes incentivadores da revolução de 1979, hoje colocam-se nas ruas por mais liberdade e menos opressão política.
A realidade do Irã não é de fácil entendimento. De sessenta anos para cá, aquele país sofreu golpes, graças à intervenção da Grã -Bretanha e dos Estados Unidos, que sempre invejaram as fontes petrolíferas do país persa. As sete irmãs, as conhecidíssimas companhias petrolíferas, não aceitavam a nacionalização do petróleo ocorrida nos anos 50.
Além do mais, o Irã enfrentava de perto todo o potencial bélico e imperialista da ex-União Soviética.
Em 1979, a união dos religiosos, estudantes, intelectuais, comunistas e militares derrubou o corrupto e truculento reinado do Xá Reza Pahlevi. Pode parecer brincadeira, mas à época do reinado daquele déspota, o Irã era o país mais bem armado do Oriente Médio e um forte aliado de Israel. O Irã era até então um grande inimigo dos governos árabes e anti-palestino.
Em 1979 aquela realidade absurda foi modificada. Hoje, o Irã é o maior inimigo de Israel, é pró-palestino e aproxima-se dos países árabes mais à esquerda.
Todo o armamento poderosíssimo do Xá hoje sofreu adaptações tecnológicas e torna o Irã um país respeitado no aspecto militar.
Os religiosos afastaram os comunistas do poder, inclusive com perseguições e assassinatos.
E, hoje, de maneira menos truculenta e mais lenta, os militares minam parte dos imensos poderes dos Aiatolás e fortalecem-se politicamente, com o apoio dos mais miseráveis, beneficiados com as campanhas sociais do atual governo.
Na verdade, o cerne da briga não é entre os intelectuais e os religiosos, mas entre os militares, ainda que de forma discreta, e a população que não aguenta mais a opressão política.
Os militares, neste instante, têm um importante papel: manter o poder iraniano longe dos interesses ocidentais, fomentar a nacionalização e o nacionalismo, fortalecer as fronteiras do país contra eventuais ataques de terroristas e de nações inimigas e permitir o conhecimento do enriquecimento do urânio.
A Europa, Israel e os Estados Unidos têm medo de um Irã conhecedor da tecnologia da bomba-atômica. Afinal, dessa forma, o país persa seria o primeiro grande exportador de petróleo com potencial nuclear. Essa conjunção fere de frente os interesses econômicos das sete-irmãs e do expansionismo israelense.
Por isso é sempre bom ver o confronto existente naquele país com a devida cautela. Aquele povo já sofreu como poucos os efeitos das intervenções indiretas das grandes potências ocidentais. Hoje, respira liberdade em relação ao imperialismo, mas quer liberdade política maior do que as autoridades hoje permitem.
Quem está com a razão? Na questão de direitos humanos, claramente a oposição. Na questão geopolítica, o atual governo centralizador, pois o momento político é extremamente delicado com a provável intervenção bélica israelense.
Bem, se vc tiver interesse em saber um pouco mais sobre o Irã na antiguidade, aqui vai uma matéria que postei anteriormente.
A Pérsia, cerca de 500 anos antes de Cristo, tornou-se um forte império e o primeiro a conquistar terras em outros continentes. Depois de várias gerações de imperadores e após 200 anos, sucumbiu perante Alexandre Magno.Amante de história que sou, não podia deixar de relatar um pouco da fantástica história dos persas, os quais, sob o comando de um grande líder, respeitaram etnias e religiões, em uma época em que a barbárie corria solta. Ciro de Ansan, o primeiro grande imperador persa, foi um líder admirado por Alexandre, o macedônio.A pérsia foi formada por tribos de origem indo-européias que, por volta do ano 1000 AC, migraram para o que hoje é o Irã. Essas tribos são da raça ariana, aquela que ficou famosa pelos discursos racistas e inflamados de Hitler. Foi lá que surgiu a primeira religião monoteísta, o Zoroastrismo, existente e praticada até hoje no Irã.Em 600 AC, os povos aquemênida e medo se uniram e, sob a liderança de Ciro, formaram o maior império até então conhecido. Em apenas 25 anos, conquistaram a Ásia menor e Mesopotâmia inteira. Os imperadores que sucederam o primeiro líder, conquistaram a palestina, a Síria, o Egito e chegaram a tomar muitas ilhas gregas, mas não tiveram o mesmo carismo daquele.Ciro era descendente dos medos e dos aquemênidas, o que assegurou o reconhecimento de sua liderança pelos dois povos persas. Dizem que ele tinha os olhos azuis e os cabelos loiros, como os arianos.Desenho que retrata Ciro morenoRespeitado pelos gregos e admirado por Alexandre Magno, Ciro era um notável estrategista militar, um bom administrador e estadista, além de uma figura humana notável.Dizem que esse grande líder tinha visões, o que é crível, já que os imperadores persas sempre foram místicos e rodeados de magos ou bruxos e também de conselheiros.Ao conquistar territórios, o primeiro grande imperador persa construía fortalezas e estradas, e impunha a cobrança de tributos, mas permitia ao povo a livre prática religiosa e o uso da língua e dos costumes locais. Com isso, o comércio e o intercâmbio cultural eram intensos.Ele não se dispunha a ser sanguinário e se curvava aos deuses dos povos conquistados, o que o tornava popular, simpático e admirado. Muitas vezes, era visto como um verdadeiro libertador, pois vez e outra punha fim à tirania então existente, como na Babilônia. E foi lá que permitiu a libertação dos judeus escravizados, para que rumassem à sua terra natal. E 40 mil rumaram para o solo sagrado.Mas, como todo imperador, ele era megalomaníaco, o que pode ser percebido pela seguinte frase: "Eu sou Ciro, rei do mundo, grande rei, rei legítimo, rei da Babilônia, rei da Suméria e da Acádia, rei das quatro extremidades".Dizem que Ciro morreu em combate, lutando contra nômades vindos das estepes da Ásia Central, mas também há a versão de que teria morrido tranquilamente, já com idade avançada.Os imperadores que o sucederam não eram necessariamente descendentes diretos, de primeiro ou segundo grau. O primeiro a ocupar o seu lugar foi Cambises, seu filho, um déspota odiado por muitos. A ele se seguiram Dario I, Xerxes, Artaxerxes, Dario II, e Dario III.O império persa deixou como lição a necessidade de se respeitar as diferenças e de tolerar credos e culturas distintas.

domingo, 21 de junho de 2009

A ACEITAÇÃO DA VIDA

Talvez a poesia reste incompreendida.
Talvez a própria vida torne-se sem sentido.
Talvez não tenhamos motivação para viver.
Mas já pensou que talvez a vida não seja só isso?
_________________________
A vida é algo repleto de infinitudes e possibilidades.
A vida é um sonho sempre aberto, nunca terminado.
Que pode ser coletivo ou individual.
Que pode retratar o egoísmo narcísico ou a universalidade do amor.
Que pode ser apenas o relaxar e aceitar as possibilidades, todas.
_________________________
Viver não é necessariamente se dar bem.
Viver não é necessariamente esboçar eternos sorrisos.
Viver também não é chorar "ad infinitum".
Viver é o estar bem, aceitar o que se é, o que se está e também aquilo que acontece.
Viver não é conformismo, mas aceitar os contratempos, sabendo que eles são passageiros.
_________________________
A vida não é apenas matéria, mas sentido.
A vida resvala na alma para ir além, muito além do que vemos.
A vida também ultrapassa o que sentimos.
A vida, necessariamente, alcança o seu cerne, a paz interior.
_________________________
Sem paz interior não há vida, mas desejo oculto de morte.
Sem paz interior não se vê belezas, não se sente a suavidade e a brutalidade das coisas.
Sem paz interior não se busca o viver, mas o suicídio do próprio eu.
_________________________
Para viver, sinta, sonhe e ame.
Não apenas deseje coisas materiais. Deseje o bem. Multiplique as boas ações.
Sorria, sim. Mas ame mais.
Ame a sim, aos outros, a quem está próximo e distante.
Ame quem errou e quem acertou. Não diferencie.
O amor não julga. O amor não pune. O amor aceita.
_________________________
Aceite a vida.

sábado, 20 de junho de 2009

PARQUES NACIONAIS

O Brasil é um país rico em biodiversidade e desde 1937 tem tentado preservar grandes áreas, através dos chamados Parques Nacionais. Getúlio Vargas criou o primeiro Parque Nacional, de Itatiaia, ainda durante o Estado Novo.
O Brasil possui uma diversidade imensa de Parques. Vale a pena conhecê-los: Fernando de Noronha, Abrolhos, Jericoacoara, Serra da Canastra, Sete Cidades, Capivara, Lençóis Maranhenses, Emas, Guimarães, Veadeiros, Bocaina, Cipó, Cutia, Confusões, Tijuca, Parnaiba, Aparados da Serra, Caparaó, Neblina, São Joaquim, Ilha Grande, Ubajara, Descobrimento, Monte Pascoal, Pantanal, Grande Sertão Veredas e muitos outros.
Hoje, o IBAMA- Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis, ligado ao Ministério do Meio Ambiente, é o órgão responsável pela preservação, manutenção e administração dos Parques Nacionais brasileiros.
Veja um vídeo promocional (clique aqui) e depois acesse uma página muito interessante, com mapas e fotos na página virtual do IBAMA. Clique aqui para acessar.

sexta-feira, 19 de junho de 2009

OS EUA E A SUA DIREITA TERRORISTA



(O anúncio acima, no website Liberty Counsel, convida quem se orgulha de ser extremista de direita a enviar doações pela internet)

por ARGEMIRO FERREIRA - jornalista (escreve para o jornal Tribuna da Imprensa do Rio de Janeiro) e escritor (autor dos livros Informação e Dominação, Caça às Bruxas – Macartismo: Uma Tragédia Americana, O Império Contra-Ataca – As guerras de George W. Bush antes e depois do 11 de setembro).

Em abril a secretária de Segurança Interna dos EUA, Janet Napolitano, divulgou o extenso relatório de seu departamento (DHS, Homeland Security) sobre a ameaça do extremismo de direita no país. Foi ridicularizada pelo império Murdoch de mídia, Fox News à frente. Apesar da reação inicial, a advertência é afinal levada a sério depois de dois ataques extremistas – que podem ainda dividir o jornalismo da Fox.
Aparentemente os excessos dos talk shows de Murdoch preocupam também alguns jornalistas da casa. A vítima do primeiro dos ataques terroristas, em maio, foi o médico de uma clínica de aborto do Kansas, George Tiller, assassinado por um fanático da direita religiosa (saiba mais AQUI). No segundo, a 10 de junho, um extremista defensor da supremacia branca, James W. von Brunn, atacou o museu do Holocausto, na capital dos EUA, e matou um segurança a tiros (leia AQUI).

O extremismo de direita tem facções múltiplas. É religioso, patriótico e racista. Teme a invasão dos EUA por tropas da ONU e raças múltiplas, que chegariam em helicópteros negros. Em The Turner Diaries (capa abaixo, à direita), ficção racista e anti-semita, lida nas milícias que infestam o país, o autor (William Luther Pierce, sob o pseudônimo de Andrew Macdonald) retrata uma revolução violenta, guerra nuclear, tomada do poder e extermínio dos judeus e não-brancos.
A vítima do atentado do Kansas, George Tiller, era chamada pelo campeão de audiência do horário nobre na Fox News, Bill O’Reilly, de “assassino de bebês” – o que pode ter encorajado o extremismo de direita a matar Tiller. Depois do crime, O’Reilly jurou que fazia apenas “análises baseadas em fatos” e às vezes citava grupos cristãos contrários ao aborto, que chamavam Tiller de “baby’s Killer”.
“Um lugar no inferno para ele”
Jornalistas e blogs mais à esquerda acusam a Fox. “Qual o próximo alvo da ira de O’Reilly e (Glen) Beck a ser abatido a tiros por terroristas conservadores?” – perguntou a 31 de maio o blogueiro Markos Moulitsas, do Daily Kos. No mesmo dia Mike Hendricks escreveu no jornal Kansas City Star que são cúmplices todos os que se referiam à vítima, na TV, como “baby’s Killer” e “Tiller, the Killer”.
Para O’Reilly, seus críticos são “odiadores da Fox”: defendem a vítima, indiferentes à sorte de 60 mil fetos supostamente destruídos por Tiller. Ele jurou, ao mesmo tempo, nunca ter usado as expressões ofensivas ao médico. Mas o site Media Matters for America, ativo no monitoramento da mídia, relacionou as datas (foram dezenas) nas quais o dr. Tiller foi acusado daquela forma (confira AQUI).
A 27 de março, depois de Tiller ter sido absolvido em processo movido contra ele pelo fanático antiaborto, O’Reilly disse: “Tiller, o assassino de bebês, foi absolvido no Kansas. (…) Deve haver um lugar especial no inferno para esse cara”. A 3 de abril o herói do horário nobre da Fox atacou de novo: “Tiller foi absolvido no Kansas. Tiller, o assassino de bebês”. Eram afirmações dele e não citações.
Ao abordar, a 27 de abril, o veto a um projeto de lei antiaborto, ele se referiu de novo ao “caso de Tiller, assassino de bebês”. A 11 de maio, falando da secretária de Saúde Kathleen Sebelius, ex-governadora do Kansas, também observou ser aquele “o estado do dr. Tiller, o assassino de bebês”. Consumado o assassinato, não retirou o que disse: alegou cinicamente só ter usado a expressão ao citar grupos religiosos.
Fundamentalismo cristão, a ameaça
Na verdade, O’Reilly não informava. Estava numa cruzada, havia quatro anos, contra o dr. Tiller, que se tornara personagem fixo de seu talk show - até ser morto. O crime, a 31 de maio, levou mais jornalistas – Helen Kennedy no Daily News de Nova York, Keith Olbermann na MSNBC e a ex-produtora do “60 Minutes” da CBS, Mary Mapes, em artigo no Huffington Post – a culpar a pregação de ódio de O’Reilly.

Em razão disso veio ainda a reação inesperada dentro da própria Fox de Murdoch. O jornalista Shepard Smith (saiba mais AQUI), que apresenta de Nova York o noticiário Studio B, e a correspondente Catherine Harridge, que cobre o Pentágono e assuntos de segurança nacional, disseram que a morte do dr. Tiller e o ataque de James W. von Brunn ao museu do Holocausto davam relevância maior ao relatório do DHS.
Antes, ao ser divulgado o relatório, O’Reilly e Beck o repudiaram e Sean Hannity retratou o presidente Obama como o “Big Brother” de George Orwell que vigia os americanos. Smith e Harridge ousaram adotar posição oposta. O objetivo maior do DHS fora alertar os departamentos de polícia – e demais órgãos encarregados de fazer cumprir a lei – para a ameaça real do extremismo de direita.

A preocupação das autoridades do DHS, a começar pela secretária Napolitano, é compreensível. A partir do 11/9 a obsessão do país tinha passado a ser o extremismo muçulmano mas antes disso os terroristas mais ativos estavam na direita – entre eles milicianos brancos motivados pela supremacia racial e o fundamentalismo cristão obscurantista, na linha de Osama Bin Laden.
Ideais e obsessões de Oklahoma City
Na década de 1990, os federais (FBI, ATF) acompanhavam a proliferação de milícias e seitas no país, com confrontos como o que levou ao incêndio no complexo davidiano de David Koresh em Waco, Texas. Ali morreram 54 adultos e 21 crianças em 1993. Dois anos depois, em 1995, veio o atentado de Oklahoma City – o maior ocorrido no país antes do 11/9. Matou 168 pessoas e deixou mais de 800 feridas (saiba mais AQUI).
Veterano da guerra de 1991 no Iraque, o terrorista Timothy McVeigh (leia AQUI), simpático às milícias de direita, pagou com a pena de morte pelo crime. O relatório do DHS, não por acaso, alertava para a necessidade de preparar o país para o retorno dos veteranos da atual guerra do Iraque. Mas a Fox e a oposição republicana indignaram-se à mera menção desse grave problema, como se não fosse de fato preocupante.

Tratar com leviandade a morte de dr. Tiller e o ataque ao museu em Washington é um risco, como perceberam Smith e Herridge. Os bandos de direita talvez prefiram ser tratados como piada, mas são reais. Mais sensato é não subestimá-los. Até porque, com base naquele alerta do DHS, o grupo Liberty Counsel (conheça-o AQUI) já pede doações pela internet e oferece carteiras especiais aos que se orgulham de ser “extremista de direita” – para enfrentar o DHS.
Procurados pela mídia, responsáveis pelo site alegaram ser ele inofensivo, apenas humorístico – o que é duvidoso. Pregam-se ali os ideais e as obsessões das milícias: interpretação literal da Bíblia, santidade da vida (a cruzada antiaborto), valores tradicionais da família, porte de armas, redução do poder do governo federal, apoio “às nossas tropas” e aos veteranos. Timothy Weigh assinaria embaixo. Murdoch também.
__________________________________
(veja a matéria original no blog do ARGEMIRO FERREIRA - clique aqui).

quinta-feira, 18 de junho de 2009

A QUEM INTERESSA O FIM DO DIPLOMA DE JORNALISTA?

Vou ser sincero. Tem me faltado tempo para fazer o que mais gosto, escrever, mas não podia deixar de comentar uma decisão do Supremo Tribunal Federal que derrubou a exigência do diploma para o exercício da função de jornalista.
_______________________________________
Os jornalistas têm sido desprezados em sua dignidade e não é de hoje. Geralmente são os primeiros a sofrerem as agruras de uma ditadura, sendo calados e censurados; recebem os salários mais baixos dos profissionais liberais, hoje em torno de mil reais; receiam, e com razão, ser boicotados se ingressarem com ação trabalhista para cobrar o piso salarial ou as horas extras nunca pagas; não têm regalias; dão plantões; não gozam os feriados, carnaval, Natal e Ano Novo. Mesmo com tudo isso, são apaixonados pelo o que fazem.




Agora, até a profissão que exercem, que estudaram e, na medida do possível, se aprimoraram, tornou-se aberta a qualquer um. Vão desprezar os jornalistas lá longe. Nem a ditadura conseguiu isso que agora o Supremo Tribunal Federal convalidou: a contratação de "jornalistas" sem diploma.




A quem interessa essa decisão? Em primeiríssimo lugar, às empresas que sempre foram contrárias à contratação de jornalistas. Dentre elas o jornal Folha de S. Paulo. Dessa forma fica mais fácil pagar salários ainda mais baixos e ter mais lucros. É o capital falando mais alto.




Sem formação universitária específica, fica mais fácil e barato fazer revistas técnicas, sem dúvida. Basta contratar um estudante. Mas, de certo, faltará a técnica que só o jornalista possui. A qualidade, então, tende a cair. Esperem e verão o que acontecerá com as empresas que contratarem em massa "jornalistas" não formados.




Jornalista não é escritor e não se confunde com este profissional. Jornalista é aquele que tem o faro para a notícia, para investigar e para se aproximar da população que lhe dá fatos jornalísticos. Já o escritor, na maior parte das vezes, vive numa redoma, em um mundo muitas vezes onírico e nada real.




Jornalista não é apresentador, ator ou modelo, muito embora redes de televisão insistam em transformar rostos bonitinhos em apresentadores e apresentadoras de telejornais e do tempo. Jornalista é aquele que mexe com a mesmice e torna os fatos interessantes.




Muito embora hoje não haja mais oportunidade para o jornalismo investigativo no Brasil, o jornalista de verdade tem a alma investigativa, aprende a ir atrás das fontes certas e a praticar atos éticos que protejam a sua fonte contra tudo e contra todos.




O jornalista de verdade é aquele que noticia o que viu e não o que o dono do meio de comunicação exige ou propõe.




Mas onde há o jornalismo investigativo, o jornalista empregado com real liberdade de expressão e o jornalista que escreve de maneira apaixonante, você deve estar se perguntando. Há, sim. Há muitos, mas faltam oportunidades para expressarem isso, pois o mercado jornalístico é muito restrito, vigorando o conhecimento pessoal. Quem conhece mais pessoas se dá bem, em detrimento daquele profissional competente, dedicado e apaixonado.




Concordo que a maior parte das faculdades de jornalismo são fracas e não formam profissionais da forma que deveriam, mas isso não pode servir de pretexto para acabar com o diploma de jornalista. Ora, se isso fosse levado a sério, o que fazer com tantos advogados e médicos que mal sabem escrever ou interpretar sinais físicos de doença, em decorrência dos péssimos cursos que frequentaram?




Desculpe-me o Ministro relator da ação que culminou com o fim do diploma de jornalista, mas o profissional de jornalismo não tem nada a ver com cozinheiro, com o devido respeito a esse profissional das artes culinárias.




O jornalista pega fato real e o transforma em algo palatável, decifrável pela maioria da população, seguindo o princípio de bem informar. Por falar em princípio, ao contrário do que dizem muitos por aí, o jornalismo é ligado de perto a uma ciência, sim. No caso, à ciência da comunicação.




Há princípios, estudos filosóficos e científicos propriamente ditos sobre comunicação e os seus efeitos. Tanto é verdade que há profissionais especialistas em ensinar métodos de comunicação a políticos, professores, palestrantes e advogados. O marketing e também a propaganda exploram ao máximo a linguagem, havendo sérios estudos sobre a neurolinguística, inclusive. Aliás, segundo estudiosos, vivemos a era da informação, da comunicação sem barreiras, da internet.




Mas a quem mais, além de uma ou outra empresa de comunicação, interessaria o fim do diploma de jornalismo?




Não tenho dúvidas em afirmar que ao sistema. Ao sistema que premia certas profissões em detrimento de algumas importantíssimas à formação, à cidadania e à própria democracia, como é o caso dos professores e também dos jornalistas. O fim dos jornalistas diplomados interessa a um sistema que premia o produzir em massa, onde não é interessante premiar aqueles que passam informação, fazem pensar e ensinam a criticar.




O fim da exigência do diploma de jornalista não implica no fim das faculdades de jornalismo. Essas continuarão a lucrar. A inexigibilidade do diploma põe fim, sim, à esperança do trabalhador, do profissional, alcançar uma dignidade financeira, salvo raras exceções como os apresentadores de telejornais das grandes redes televisivas.




Imagino que alguns jornais e algumas redes de televisão ainda exigirão o diploma, a fim de não permitir a queda ainda maior da qualidade do jornalismo que produzem.




Àqueles idealistas que um dia sonharam ser jornalistas eu digo para não desistirem. Façam uma faculdade da área de humanas, de preferência história, sociologia ou direito e em seguida cursem jornalismo, ainda que o diploma não seja necessário. A forma de um jornalista pensar é muito diferente. A forma de um jornalista escrever também é muito diferente. A maneira de um jornalista encarar um fato qualquer é mais que diferente, é surpreendente, e isso nenhum outro profissional consegue, a não ser na banca de uma boa faculdade, com o aprimoramento através do exercício em um estágio ou profissionalmente.




Ao jornalista, dignidade. Àquele que informa, consideração. Àquele responsável pela defesa dos valores culturais, sociais e democráticos, respeito.




Se o diploma de jornalista não se faz necessário, porque exigir-se grau superior específico para administrador, advogado, médico, engenheiro, sociólogo, antropólogo, psicólogo etc? Qual a razão dessa diferenciação, dessa discriminação não amparada em lei?

quarta-feira, 17 de junho de 2009

terça-feira, 16 de junho de 2009

TRANSEXUAL FEMININO CONSEGUE ALTERAR NOME SEM CIRURGIA

A Defensoria Pública do Estado de São Paulo em Bauru foi intimada, na última semana, de decisão judicial inovadora que garante a transexual mudança de nome e de sexo em todos seus documentos pessoais sem que tenha se submetido à cirurgia de redesignação sexual. Pela sentença, o transexual, que nasceu com seu sistema reprodutivo feminino, passará a ser oficialmente chamado pelo nome masculino o qual é conhecido desde a adolescência.

“Em relação ao procedimento cirúrgico de transgenitalização é providência de cunho essencialmente íntimo, a ser realizado quando quiser. A inexistência desse procedimento (...) não implica em impossibilidade de retificação do registro civil, diante do quadro real e psicológico que vivencia”, afirmou a Juíza de Direito Rossana Teresa Curioni Mergulhão, que proferiu a sentença.

A decisão baseou-se nos argumentos da defensora pública Márcia Rossi Coraini de que “a finalidade do nome é o conhecimento e individualização de uma pessoa no meio em que vive”, que o “registro público tem que manter relação direta com aquele aceito socialmente” e que a alteração pode ser feita naqueles casos em que a pessoa possua nome capaz de expor ao ridículo.

No caso o transexual foi registrado como sendo do sexo feminino, mas desde a mais tenra idade possui identidade psicológica masculina e é reconhecido no meio social como sendo do sexo masculino, sentindo-se constrangido quando seu nome é revelado em lugares públicos. O transexual, de 29 anos, se submeteu na adolescência a tratamento hormonal e cirúrgico para retirada de mamas e vive há mais de três anos em companhia de uma mulher e seus filhos.

A ação foi proposta em fevereiro de 2008 e o pedido foi julgado procedente em fevereiro deste ano. A ação tramitou na 1ª Vara Cível da Comarca de Bauru
_______________________________________
DO BLOGUEIRO: Há transexuais masculinos e femininos. Ambos sofrem pelo fato de nascerem com cabeça pertencente a um sexo e corpo pertencente a outro. Essa dicotomia causa sofrimentos, traumas e suicídios. A legislação nacional é avançada e permite a mudança de nome e de sexo, desde que haja avaliação psiquiátrica por tempo prolongado.

domingo, 14 de junho de 2009

UM POUCO SOBRE JOÃO GOULART

João Goulart, o herdeiro político de Getúlio Vargas e voltado à solução dos problemas sociais, foi presidente do Brasil. Deposto, perseguido e, segundo indicam fortes indícios, assassinado por agentes da Operação Condor, é um grande homem que o Brasil não pode esquecer.
Veja os vídeos.

Para refletir:

Para viver, sinta, sonhe e ame.
Não deseje apenas coisas materiais.
Deseje o bem e multiplique as boas ações.
Sorria, sim. Mas ame mais.

Ame a si, aos outros, a quem está próximo e distante.
Ame quem errou e quem acertou.
Não diferencie.

O amor não julga. O amor não pune. O amor aceita.
Pense nisso e aceite a vida.

Vamos brincar com as palavras?



Postagens populares

__________________________________________________________________________
___________________________________________________________________________________
NOTÍCIAS, OPINIÕES, ARTIGOS E MEROS ESCRITOS, POR CYRO SAADEH
um blog cheio de prosa e com muitos pingos nos "is"

___________________________________________________________________________________