Falar ou mesmo pensar em Direitos Humanos causa polêmica ou apreensão, pois, muitas vezes, são vistos como os direitos dos outros, daqueles que nada têm a ver conosco. Humanos somos todos nós; portanto, falar de Direitos Humanos diz respeito a todos. O estudo dos Direitos Humanos é, antes de tudo, a luta incansável pela reafirmação das liberdades, o que inegavelmente atrapalha e incomoda as redes de poder já constituídas. Entretanto, é a liberdade que nos torna verdadeiramente humanos.
Para muitos, os Direitos Humanos são despidos de sentido e de significado, é como se não lhe dissessem respeito. Teima-se em desconhecer que só alcançaremos um mundo mais igualitário, justo e que respeite o outro, quando iniciarmos uma construção coletiva, quando olharmos o outro em suas peculiaridades e particularidades, quando pudermos nos enxergar no outro. O estudo dos Direitos Humanos nos garante outra perspectiva, aquela que nos permite olhar além de nós mesmos. Para estudar Direitos Humanos é preciso compreender que a igualdade e a dignidade são direitos basilares de todos.
O reconhecimento das nossas próprias incongruências e falibilidades é passo inicial para a consolidarmos uma agenda de efetivação dos Direitos Humanos. Diante de tudo isso, nos demos conta do quanto somos limitados dentro de nossos mundos, no conforto de nossas profissões, marcadas por dogmas seculares e arraigados, pouco criativos e voltados para nós mesmos.
No exercício da Advocacia Pública, sentimos a necessidade de nos aprofundarmos no estudo de questões que nos afligem diariamente em nossas vidas e em nosso trabalho. Em uma análise superficial pode parecer que os Direitos Humanos se contrapõem à atuação de advogados que defendem um ente público, o que não é real. O Estado não deve ser visto como opositor dos Direitos Humanos, senão como seu depositário e guardião. Assim, cabe ao Advogado Público orientar os administradores públicos a suprimirem os obstáculos que desrespeitam a dignidade da pessoa humana, de modo que, é o Advogado Público quem deve orientar juridicamente o Estado a fazer políticas públicas que concretizem os Direitos Humanos como saúde, educação, segurança, meio ambiente.
Como podem perceber, muitas inquietudes nascem do estudo dos Direitos Humanos e destas inquietudes é que nasceu um feliz encontro de pessoas que têm o sonho de serem agentes transformadores da realidade. Ao nos encontrarmos, percebemos que tínhamos em comum o mesmo desejo, que era estudar e disseminar conhecimentos e ideias para contribuir na construção de um mundo mais livre, menos segregador e mais justo.
Nesse contexto, nasceu o Grupo Olhares Humanos que, embora com proposta multidisciplinar, reúne, hoje, Procuradores do Estado que querem olhar além de si próprios.
Percebemos que para pensar os Direitos Humanos é preciso ter a capacidade de olharmos para além de nós mesmos. É preciso ter a capacidade de olharmos para o outro na sua singularidade, nas suas diferenças. E é deste olhar que falamos, é este olhar que propomos.
Olhar o outro é olhar sem distinção, é garantir que cada sujeito possa usufruir plenamente de todos os seus direitos. Olhar o outro é ver além da raça, da cor, do sexo, da língua, da religião, da opinião política, da posição social ou econômica. Olhar o outro é respeitar a dignidade e a subjetividade de cada pessoa.
Não é possível ficarmos inertes diante do mundo, é preciso atuar, fazer algo. Entretanto, sabemos que é necessária certa rebeldia diante do sofrimento, não podemos ficar inertes diante da dor de outro ser humano. Não é tarefa fácil e imediata, mas se mostra como uma luta diária e sem prazo definido, mas que escolhemos assumir ao criarmos o Grupo Olhares Humanos.
O olhar humano é o olhar rebelde, que se direciona para fora, para o outro, para além de nós mesmos. É poder olhar o outro que nos torna mais humanos.
Margarete Gonçalves Pedroso é Procuradora do Estado, ex-conselheira eleita da PGE, colaboradora do Grupo Olhares Humanos e atual integrante do Conselho Estadual da Condição Feminina.