Diário Liberdade - Michael Collon
Parte do valioso texto escrito pelo jornalista belga Michael Collon, sobre as causas reais da ofensiva imperialista contra a Líbia.
Aqueles para quem a democracia é perigosa As potências coloniais ou neocoloniais de ontem nos juram que mudaram. Após ter financiado, armado, aconselhado e protegido Ben Alí e Mubarak e companhia, agora os EUA, França e outros nos inundam com declarações comoventes. Como Hillary Clinton: "Nós apoiamos a aspiração dos povos árabes à democracia".
Mentira total. Os EUA e seus aliados não querem em absoluto uma democracia árabe, não querem em absoluto que os árabes possam decidir sobre seu petróleo e restantes riquezas. Fizeram todo para evitar a democratização, para manter no poder aos responsáveis pelo antigo regime. E quando isso não funciona, impor outros dirigentes encarregados de desmobilizar as resistências populares. O poder egípcio, por exemplo, acaba de tomar medidas anti-greve muito brutais.
Explicar a guerra contra a Líbia com a ideia de que após a Tunísia e o Egito, Washington e Paris teriam "compreendido" e quisessem lavar sua consciência ou, em todo caso, melhorar sua imagem, não é mais que uma grossa mentira. Na realidade, a política ocidental no mundo árabe forma um conjunto que se aplica com três forma diferentes: 1. Manter ditaduras repressivas. 2. Substituir Mubarak e Ben Alí por peões sob seu controle. 3. Derrocar os governos de Trípoli, Damasco e Teerã para recolonizar a estes países "perdidos". Três métodos, mas um só objetivo : manter o mundo árabe sob domínio para continuar explorando-o.
A democracia é perigosa quando se representa somente os interesses de uma pequena minoria social. O que mais medo dá a EUA é que o descontentamento social tenha rebentado em quase todas as ditaduras árabes... No Iraque (nossos meios não disseram nada) numerosas greves afetaram o petróleo, o setor têxtil, eletricidade e outros setores. Em Kut, tropas dos EUA inclusive cercaram uma fábrica têxtil em greve. Houve manifestações em 16 das 18 províncias, com todas as comunidades juntas, contra o governo corrupto que abandona na miséria a seu povo. No Bahrein, sob a pressão da rua, o rei terminou por prometer uma ajuda especial de 2650 dólares à cada família. Em Omã, o sultão Qaboos bin Said, alterou para a metade do governo e aumentou o salário mínimo 40% e ordenou criar 50.000 empregos. O mesmo rei saudita, Fahd, desbloqueou 36 mil milhões de dólares para ajudar as famílias com baixos rendimentos.
Evidentemente, uma questão surge entre a gente simples: como é que tinham todo este dinheiro? Por que o tinham guardado em seus cofres? E a seguinte pergunta: Quantos milhares de milhões mais roubará a seus povos com a cumplicidade dos EUA? E a última: Como pôr fim a todo este roubo?
As Revoluções 'Facebook', um grande complô made in USA ou autênticas revoluções?
Uma interpretação errônea está-se difundindo pela internet: as revoluções árabes seriam desencadeadas e manipuladas pelos EUA, que iria puxando das cordas com o fim de provocar mudanças muito controladas e assim poder atacar a Líbia, a Síria, o Irã. Todo seria "fabricado". O argumento desta hipótese: organismos mais ou menos oficiais convidava a ir aos EUA e formado "cyberactivistas" árabes que jogaram um papel ponteiro na circulação de infos e que simbolizaram uma revolução de novo tipo, "a revolução facebook".
A ideia deste grande complô não se sustenta. Na realidade, os EUA fizeram tudo por manter o maior tempo possível Mubarak, um ditador muito útil. No entanto, os EUA sabia que tinha má saúde e estava "acabado". Neste tipo de situações, os EUA preparam evidentemente um "plano B" e inclusive um "plano C". O plano B consistiria em substituir Mubarak por um de seus colaboradores. Mas isto não tinha muitas possibilidades de funcionar visto o cólera do povo egípcio.
Por conseguinte, EUA tinha um, ou muitos, Plano C, como o costumam fazer, por outra parte, em praticamente qualquer país que querem controlar. Em que consiste? Compra por adiantado a alguns opositores e intelectuais -sejam ou não conscientes- e "investe" em futuro. Chegado no dia, empurra esta gente para diante da cena. Quanto tempo funcionará isto, é outra questão desde o momento em que a população se mobiliza e um regime, inclusive remaquiado, não é capaz de resolver as reivindicações populares quando seu objetivo é manter a exploração da gente.
Falar de "revolução facebook" é um mito que dá jeito aos EUA. Tal como assinalamos desde faz muito tempo a importância dos novos métodos de informação e mobilização pela internet, igualmente consideramos absurda a ideia de que Facebook substitua as lutas sociais e as revoluções. Esta ideia da jeito aos grandes capitalistas (dos quais Mubarak era bom representante), mas na realidade o que eles temem acima de tudo é a contestação dos trabalhadores, porque põe diretamente em perigo sua fonte de lucros.
O papel dos trabalhadores
Facebook é um método de luta, mas não é a essência da revolução. Esta apresentação pretende escamotear o papel da classe operária (em sentido amplo), que seria substituída pela internet. Na realidade, uma revolução é uma ação mediante a qual os de abaixo liquidam aos de acima. Com uma mudança radical não só do pessoal político senão sobretudo nos relacionamentos de exploração social.
Ai ! Segundo nossos grandes pensadores oficiais faz tempo que não teríamos já o direito de usar o termo ?luta de classes?, que está já antiquado e até é um pouco obsceno. Não têm sorte, o segundo homem mais rico do mundo, o grande banqueiro Warren Buffet, o soltou faz já tempo: "De acordo, há uma luta de classes na América. Mas é minha classe, a classe dos ricos, que faz a guerra e a ganhamos"[4]. Senhor Buffet, isso não deve ser jurado nunca antes de ganhar a partida! O último que ri...
Mas as realidades tunisinas e egípcias confirmam a atualidade da luta de classes, de acordo com o senhor Buffet? Quando Ben Alí teve que fazer suas malas? A 14 de janeiro, quando os trabalhadores tunisinos estavam metidos em uma greve geral. Quando deixou Mubarak seu trono? Quando uma potente greve dos operários egípcios paralisou as fábricas do têxtil, correios e até os meios oficiais de comunicação. Explicação de Joel Beinin, professor na Universidade Stanford e antigo diretor da universidade americana do Cairo: "Estes dez últimos anos, uma onda de protestos sociais vinha afetando a mais de dois milhões de trabalhadores em mais de três mil greves, sentadas e outras forma de protesto. Esse foi o pano de fundo de todo este levantamento revolucionário das últimas semanas... Mas é que nos últimos dias, se viu a dezenas de milhares de trabalhadores unir suas reivindicações econômicas à exigência de abolir o regime de Mubarak..."[5]
A revolução árabe não fez mais que começar. Após as últimas vitórias populares, a classe dominante, sempre no poder, tenta apaziguar o povo com algumas pequenas concessões. Obama desejava que a rua se acalmasse o antes possível e que todo ficasse como dantes. Isso pode funcionar um tempo, mas a revolução árabe está em marcha. Poderá tomar anos, mas será muito difícil pará-la.