Diário Liberdade - Michael Collon
Parte do texto divulgativo de Michael Collon sobre a guerra imperialista contra a Líbia, as suas causas e as pistas para atuar no campo anti-imperialista.
Objetivo nº 4: Impedir a unidade africana
África é o continente mais rico do planeta em abundância de recursos naturais, mas é também o mais pobre. 57% de sua população vive abaixo do limiar da pobreza, isto é, com menos de 1,25 euros por dia. A chave deste mistério? Justamente que as multinacionais não lhe pagam estas matérias-prima, roubam-nas. Na África rapinam os recursos, impõem baixos salários, acordos comerciais desfavoráveis e privatizações nocivas, exercem toda sorte de pressões e extorsões a Estados débeis, os estrangulam com uma dívida injusta, instalam a ditadores complacentes, provocam guerras civis nas regiões apetitosas...
África é estratégica para as multinacionais porque sua prosperidade está baseada no saque de seus recursos. Se se pagasse um preço correto pelo ouro, o cobre, o platino, o coltan, o fosfato, os diamantes e os produtos agrícolas, as multinacionais seriam muito menos ricas mas as populações locais poderiam ser afastadas da pobreza.
Para as multinacionais dos EUA e da Europa é por isso vital impedir que a África se una e se emancipe. Tem que seguir dependente. Um exemplo, muito bem exposto por um autor africano, Jean-Paul Pugala... "A história começa em 1992, quando 45 países africanos criam a sociedade RASCOM para dispor de um satélite africano e fazer cair os custos de comunicação no continente. Telefonar desde ou para a África tem a tarifa mais alta do mundo já que tinha um imposto de 500 milhões de dólares que a Europa cobrava por ano sobre as conversas telefônicas, inclusive ao interior do mesmo país, pelo trânsito de voz pelos satélites europeus como o Intelsat.
Um satélite africano custava justamente 400 milhões de dólares que podiam ser pagos de uma vez e não os 500 milhões de aluguel por ano. Que banqueiro financiaria tal projeto? Mas a equação mais difícil de resolver era: como pode o escravo libertar da exploração servil de seu amo lhe solicitando ajuda para conseguir isso? Assim estiveram o Banco Mundial, o FMI, EUA, a União Européia enganando inutilmente estes países durante quatorze anos. Foi então quando Kadafi, em 2006, pôs fim ao suplício desta inútil mendicidade a países ocidentais pretensamente bem-feitores, praticantes de empréstimos a interesses de usura; o líder libio pôs em cima da mesa 300 milhões de dólares, o Banco Africano de Desenvolvimento, 50, o Banco oeste-Africano de Desenvolvimento, 27; e assim é como África, desde 27 de dezembro de 2007, tem seu primeiro satélite de comunicação de sua história. Em seguida, a China e a Rússia implicaram-se, neste caso cedendo sua tecnologia, o que permitiu o lançamento de novos satélites, sul-africano, nigeriano, angolano, argelino; inclusive um novo satélite africano foi lançado em julho de 2010. Espera-se para 2020 que o primeiro satélite tecnologicamente 100% africano seja construído em solo africano, concretamente na Argélia. Este satélite está previsto que concorra com os melhore do mundo, mas a um custo dez vezes menor; um autêntico desafio.
Tenho aqui como um simples gesto simbólico, de uns 300 milhões, pode mudar a vida de todo um continente. A Líbia de Kadafi fez perder ao Ocidente, não só os 500 milhões de dólares por ano, como também os milhares de milhões de dólares em dívida e juros que esta mesma dívida permite gerar até o infinito e em escala exponencial, contribuindo assim para manter oculto o sistema de espólio da África. (?) É a Líbia de Kadafi a que oferece a toda a África sua primeira revolução verdadeira dos tempos modernos: assegurar a abrangência universal do continente por telefonia, televisão, radiodifusão e muitas mais aplicações como a telemedicina e a educação a distância. Pela primeira vez uma conexão a baixo custo está disponível em todo o continente, até nas zonas rurais graças ao sistema ponte por rádio WMAX.[6]
Já estão vendo, algo que nunca se nos tinham contado do mau de Kadafi! Que ajudava os africanos a se emanciparem da abafante tutela dos ocidentais. E não haverá outras coisas mais deste gênero nunca ditas?
Kadafi desafiou o FMI e Obama joga de carteirista
Sim. Ao sustentar o desenvolvimento do "Fundo monetário africano" (FMA), Kadafi cometeu o crime de desafiar o FMI. Já sabemos que o FMI, controlado pelos EUA e Europa, presido por Dominique Strauss-Kahn, exerce uma verdadeira extorsão sobre os países em desenvolvimento. Emprresta-lhes dinheiro somente a condição de esses países aceitarem ceder suas empresas em benefício das multinacionais, fazer pedidos sem qualquer proveito ou de reduzir seus orçamentos em saúde e educação. Em uma palavra, este banqueiro FMI é muito nocivo.
Bem, pois tal como os latinos lançaram seu próprio Banco Sul, para contra-arrestar as chantagens arrogantes do FMI e decidir por si mesmos que projetos realmente úteis querem financiar, o FMA poderia começar a oferecer uma via mais independente aos africanos. E quem financia o FMA? A Argélia contribuiu com 16 mil milhões e Líbia com 10 mil milhões. Isto é, 62% de sua capital.
Ao invés, com a maior discreção midiática, Obama acaba simplesmente de roubar trinta mil milhões ao povo líbio. Como? No 1º de março (muito antes da resolução da ONU), deu ordem ao Tesouro USA de bloquear os depósitos da Líbia nos EUA. Depois, a 17 de março, fez o necessário para incluir na resolução 1973 da ONU uma pequena frase que autoriza a congelar os fundos da banca central líbia bem como os da companhia nacional líbia de petróleo. Já sabemos que Kadafi amassou um tesouro petroleiro que lhe permitiu investir em grandes sociedades européias, em grandes projetos de desenvolvimento africano (e talvez também em algumas campanhas eleitorais européias, mas isto não parece constituir uma forma eficaz de seguro de vida!...)
Em definitivo, a Líbia é um país demasiado rico (200 mil milhões de dólares em reservas) que atraiu as ambições de uma potência hiper-endividada, EUA. Então, para desviar as dezenas de milhares de milhões de dólares da banca nacional libia, isto é, roubando dos bolsos do povo libio, Obama batizou assim, simplesmente, tudo isto de "fonte potencial de financiamento do regime Kadafi" com o qual a cartada foi feita. Um autêntico ladrão.
Apesar de todos seus esforços para abrandar o Ocidente multiplicando as concessões ao neoliberalismo, Kadafi seguia inquietando os dirigentes dos EUA. Um cabo da embaixada de EEUU em Trípoli, com data de novembro 2007, lamenta esta resistência: "Os que dominam a direção política e econômica da Líbia levam políticas a cada vez mais nacionalistas no setor da energia". Recusar toda privatização justifica os bombardeios? A guerra é certamente a continuação da economia por outros meios.