domingo, 21 de março de 2010

SANTO DAIME E A DROGA

Com a morte do cartunista Glauco, surge a polêmica: é admissível que uma seita adote o uso de psicotrópico?

É interessante anotar, desde já, que desde os primórdios os seres humanos imaginaram aproximar-se das divindades (então eram muitas) através dos mais diversos alucinógenos. Depois, vieram os sacrificios humanos, como matéria de troca ou gratidão, e, por fim, outras formas de transcender, como a dança, a cantoria e a meditação.

Vários rituais existem para a aproximação com o divino. Várias são as formas de enxergar a Deus e de se aproximar a ele. Alguns julgam adotar formas melhores que outros, algo típico do ser humano.

Hoje, há uma vertente que diz que devemos vivenciar o "já" ao extremo, ter prazeres fáceis e consumir tudo o que nos satisfaça. É o materialismo consumista capitalista disfarçado de crença: de crença na matéria ou seria na antiga e quase esquecida "seita do Bezerro de Ouro", que implicou na quebra das tábuas dos Dez Mandamentos? Mas não é esse o propósito desse artigo. Voltemos ao ponto central.

Há os que criticam o candomblé pela "matança" de galinhas, outros o islamismo pela matança de "carneiros" etc. Como disse, uns humanos se julgam superiores aos outros, num jogo claro de poder, e utilizam a fé como pretexto para isso.

Não é apenas o Santo Daime que provoca o afastamento da razão plena, como conhecemos. As cantorias de muitas fés também levam a isso. Até as danças e o aparentemente inofensivo cinema também nos conduzem à possível manipulação e à visão abstrata e diferente da palpável, daquela que julgamos real.

Muitas são as drogas, muitas consideradas lícitas e outras ilíticas. O álcool é a droga lícita de mais fácil constatação. E agora o Santo Daime entra na polêmica. Devemos manter a tolerância do uso desse psicotrópico por seita composta por cidadãos brancos não indígenas? Lembro que o Santo Daime é uma bebida com efeitos alucinógenos ingerida inicialmente por indígenas da Amazônia em cultos religiosos.

Mas faço outra pergunta, uma pergunta em sentido contrário: por qual motivo proibir? Por qual motivo tachar isso de errado e dos seus seguidores de pessoas imorais?

Esse radicalismo me recorda o fascismo, onde a conduta humana devia seguir uma única diretriz e todos os deslizes ou rumos diversos eram sinais de fraqueza. Para o fascismo, o diferente era inaceitável. E para a nossa sociedade, hoje, será muito diferente?

Porque podemos frequentar os Shopping Centers e nos alucinarmos com o consumismo de roupas e outras coisas muitas vezes desnecessárias ou desproporcionais e não podemos frequentar nossas Igrejas e termos o nosso culto particular, com rituais próprios? (ressalto de antemão que não frequento o Santo Daime)

É importante observar que até o início do século passado o uso de maconha e de cocaína era permitido nas ruas, nas praças públicas, a céu aberto. Hoje, não. Não digo que antes havia acerto. Não. Mas também não digo que hoje há acerto. Isso envolve discussões, que deve estar livre de dogmas e preconceitos. Deve haver uma discussão racional. E se é racional, evidencia que os partícipes não devem usar, ao menos no instante da discussão, qualquer substância alucinógena ou que propicie a alucinação.

Nas religiões, que sempre envolvem crenças e rituais próprios, não creio ser certo proibir ou discriminar determinados atos típicos. O Santo Daime não foi uma seita criada para usar drogas ilicitas. O objetivo, como de todas as outras religiões, era, e ainda aparenta ser, a transcendência, a aproximação com o Divino.

Por isso eu digo e reafirmo, a discussão não deve se limitar ao uso de alucinógenos, ainda mais em cultos religiosos. A discussão deve se dar na política que adotamos para o combate das drogas ilícitas e ao tratamento que damos aos usuários e dependentes. Não podemos tapar o sol com a peneira e culpar uma seita que não trabalha com o ilegal.

Ademais, pelo o que se sabe, o assassino de Glauco não estava sob os efeitos do Santo Daime ao matar o cartunista. Aparentemente, trata-se de um psicopata que precisa de tratamento. Mas a nossa sociedade, que apenas culpa, critica, adora o poder e o consumismo materialista, sem nunca resolver seus problemas intrínsecos, também sofre de algo assemelhado à psicopatia e, pelo o que sabemos, nunca precisou de alucinógenos para agravar a sua situação. Poderemos também ser condenados, todos nós, à prisão que já vivenciamos, a da hipocrisia?

Para refletir:

Para viver, sinta, sonhe e ame.
Não deseje apenas coisas materiais.
Deseje o bem e multiplique as boas ações.
Sorria, sim. Mas ame mais.

Ame a si, aos outros, a quem está próximo e distante.
Ame quem errou e quem acertou.
Não diferencie.

O amor não julga. O amor não pune. O amor aceita.
Pense nisso e aceite a vida.

Vamos brincar com as palavras?



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