Um desafio de políticas públicas que o Brasil ainda não enfrentou de verdade: a reinserção de presos e ex-presos no mercado de trabalho. E, no entanto, esta é uma tarefa urgente a ser encarada pelos governos, pelas empresas e pela sociedade.
Desigualdades sociais e má distribuição de renda alimentam as altas taxas de delinqüência e criminalidade em nosso país. Por isso, o sistema prisional brasileiro está no limite. Tem capacidade para abrigar 299 mil presos, mas acolhe, hoje, 470 mil pessoas, de acordo com o Departamento Penitenciário Nacional. 45% delas não têm o ensino fundamental completo. Este fato, agregado ao preconceito, torna a continuidade no crime a única “opção” para o ex-detento. Por isso, a taxa de reincidência criminal no país chega a 70%, uma das mais altas do mundo. Outro dado impressionante: há 550 mil mandatos de prisão a cumprir.
Os governos não avançam em políticas públicas de reinserção porque a sociedade ainda vê com preconceito esta alternativa, considerando-a um “desperdício” de dinheiro público. Mas desperdício é deixar como está. A população carcerária no Brasil é composta fundamentalmente por jovens entre 18 e 29 anos. Vale a pena deixá-los sem futuro?
Este cenário precisa mudar e depende, basicamente, de ações do Estado em conjunto com a iniciativa privada. Tal fato já vem ocorrendo de forma pontual. Em Minas, uma parceria entre o setor privado e o governo estadual garante capacitação e contração de egressos do sistema penitenciário.
No final do ano passado, o Conselho Nacional de Justiça (CNJ) e o Supremo Tribunal Federal (STF) lançaram a campanha “Começar de Novo” para sensibilizar a população para a necessidade da recolocação, no mercado de trabalho e na sociedade, do preso libertado após cumprimento da pena. E uma das primeiras ações para reintegrar egressos no mercado de trabalho veio do Ministério do Esporte. No início de janeiro, este ministério assinou um convênio com o STF e o Comitê Organizador da Copa do Mundo de 2014 para contratação de presos, ex-presos e adolescentes em conflito com a lei para obras e serviços nas 12 capitais brasileiras que vão sediar jogos. O SENAI também já se integrou ao Começar de Novo, fornecendo bolsas de estudo para presos e ex-presos. Em alguns estados, vai instalar escolas dentro dos presídios.
Agora, o governo de Goiás e a Hering firmaram parceria para a reinserção de presos em regime fechado. Nos presídios de Aparecida de Goiás, Anápolis e São Luís dos Montes Belos, 250 detentos trabalham em oficinas de costura e no manuseio e etiquetagem de peças de roupa fabricadas pela empresa. Cada preso recebe vinte reais por mil peças produzidas e um dia de redução da pena para cada três trabalhados.
Uma pequena construtora de Goiás, a JM Participações, também emprega presidiários em regime semi-aberto na construção civil.
No Estado de São Paulo, desde o fim de 2009 o governo pode exigir de empresas que vencem licitações a contratação de até 5% de ex-detentos. O mesmo já ocorre também no Distrito Federal e no Espírito Santo.
Há as vantagens financeiras para as empresas: os presos não estão sujeitos ao regime de CLT; os encargos dos presos são normalmente pagos pelo Estado e o salário pode ser menor que o piso da categoria. Mas, estes benefícios sempre existiram na nossa legislação e nem por isso atraíram empresas. O que ocorre atualmente é a vontade política de governos, empresas e sociedade em enfrentar a violência e a criminalidade por meio da inclusão social pelo trabalho.