Não é fácil ser brasileiro. Somos um povo discriminado, enquanto temos um presidente que torna-se cada vez mais popular em todo o planeta. Se, por um lado, é bom termos um líder respeitado no mundo afora, isso talvez não seja suficiente para solucionar esse mal.
Os brasileiros viajam mundo afora em busca de melhores condições de vida, sejam elas de raiz econômica ou de mero bem-estar, longe da violência urbana que nos permeia, do relativo baixo investimento em transporte público e da verdadeira e absurda falta de ocupação dos espaços públicos e insuficiente investimento em educação e cultura. Viaje à Europa e perceba que: a) há uma estação do metrô presente, pelo menos, a cada 4 ou 5 quadras de cada grande cidade; b) há trens com qualidade e conforto para vários locais; c) as pessoas nacionais locais têm um bom nível cultural e educacional; d) a leitura de livros e jornais e revistas de qualidade é um hábito sagrado e consagrado; e) não há a vertiginosa colina de diferença de padrão social e econômico que existe nos países empobrecidos, em especial o Brasil com a sua internacionalmente famosa injustiça social; f) as pessoas vão às praças, parques e a região central, inclusive e principalmente nos finais de semana; g) na maior parte das vezes, as boas salas de cinema e os melhores restaurantes estão nas velhas ruas do centro. Essa é a europa, berço do Renascentismo e Iluminismo. NO Brasil tudo é tão diferente!
É evidente que nem tudo são mares de rosa. Há muita discriminação em razão de cor, credo ou religião e nacionalidade em todos os países da Europa, variando apenas o alvos dessa barbárie que permeia a "alma". Não são apenas os africanos, chineses, árabes e muçulmanos os atingidos. Os latino-americanos e em especial os brasileiros são vítimas de racismo e preconceitos de outra ordem, não apenas na Europa, mas em todos os cantos do planeta.
Somos um povo afável, de fácil aproximação e talvez isso permita criar um estereótipo não tão agradável e pouco menos correto. Os brasileiros são vistos como mão-de-obra concorrente e normalmente barata (com exceção aos grandes executivos brazucas de multinacionais), enquanto as brasileiras, insistentemente, são vistas como fáceis, senão prostitutas, em todos os cantos e recantos desse mundo.
O mínimo que uma brasileira recebe ao ter anunciada a sua nacionalidade são cantadas grosseiras e de péssimo gosto, normalmente direcionadas pelo interlocutor para uma relação sexual fácil.
Arrisque dizer que é brasileira para ver como será a reação em alguns países... Haja coragem!
É verdade que há muitas brasileiras que se prostituem em praticamente todos os países desse mundo azul (dizem alguns que elas já são mais de cem mil), mas isso não significa que mulheres brasileiras possam ser sinônimo de prostitutas, seja porque há mais de 5 milhões de brasileiros vivendo além da fronteira nacional, seja porque a prostituição existe em todos os países, mesmo nos mais fechados e conservadores. Nada contra quem exerce essa profissão que se diz a mais antiga do mundo, em que há uma carga horária exaustiva e um serviço difícil que não é para qualquer um. Só mesmo uma prostituta para suportar pessoas (clientes) normalmente asquerosas, bêbadas e que muitas vezes não fazem questão de serem cordiais.
Normalmente são moças jovens que se tornaram mães e provedoras da família que se arriscam na difícil vida de alugar o desejo e também o próprio corpo. Elas são verdadeiras guerreiras e até heroínas, embora sejam discriminadas socialmente, inclusive no Brasil.
Mas escrevo isso para demonstrar o profundo desagrado que tive ao ler que um dos fortes candidatos à presidência da República do Suriname disse que "talvez os maroons (negros descendentes de escravos) achassem que podiam estuprar as brasileiras porque eram prostitutas". Primeiramente, devo esclarecer que a maior parte das brasileiras, no Suriname, trabalham no garimpo, como qualquer homem. Poucas são as que se prostituem. Segundo, observo que, ainda que as brasileiras atingidas fossem prostitutas, jamais poderia haver contra elas uma relação sexual forçada, qualquer que fosse o suposto "motivador" de tal ato. A frase do líder dos maroons retrata não apenas mau gosto, machismo, preconceito em relação aos brasileiros e às próprias mulheres em especial, mas o sentido de que nós brasileiros precisamos mudar urgentemente a forma como as brasileiras são vistas fora de nossos muros.
Os atos bárbaros, preconceituosos e criminosos que aconteceram no Suriname contra as brasileiras que foram estupradas, infelizmente, podem voltar a ocorrer, não apenas lá, mas em outros países.
E o Suriname não é um país bárbaro e culturalmente muito diferente da maioria dos países da América Latina. Ex-colônia holandesa, o Suriname revela algumas curiosidades. Possui cerca de 600 mil habitantes, situa-se entre o Oceano Atlântico e a floresta amazônica, já foi comunista e um dos países apoiadores do regime de Fidel Castro, de Cuba. New York, então New Amsterdã, fundada por colonizadores holandeses no que hoje é os Estados Unidos, foi trocada pelos ingleses, também colonizadores, pela cidade que hoje se situa no território do Suriname. Nós, brasileiros, de modo geral, conhecemos muito pouco os nossos vizinhos, e deveríamos saber o que pensam sobre nós, para mudarmos alguns conceitos formados sobre o nosso povo e em especial sobre as nossas mulheres.
Podemos nos tornar uma potência econômica e um país de relevo no aspecto geopolítico, mas a dignidade de cada pessoa também deve ser buscada. Silenciar-se perante atos afrontosos à dignidade de cada mulher brasileira é permitir que o estereótipo existente no mundo afora se solidifique e crie, por consequência, maiores dores às vítimas desse preconceito da pior espécie, sinal revelador de que o ser humano não se diferencia dos bípedes que vivem em bandos, gostam de bananas e se penduram em galhos. O preconceito contra as mulheres, em especial as brasileiras que são chamadas de prostitutas, revela um machismo nada dissimulado de muitos ocidentais, justamente os mesmos que julgam compor uma civilização superior... Aonde?