domingo, 28 de fevereiro de 2010

Jobim, Vannuchi e a memória brasileira: anistia não é amnésia


Indignados com o PNDH (Programa Nacional de Direitos Humanos), lançado em solenidade oficial presidida por Lula, em dezembro, o ministro da Defesa, Nelson Jobim, e os comandantes das Forças Armadas teriam apresentado suas renúncias, recusadas pelo presidente da República.

Lula teria prometido rever três ou quatro pontos do programa, como os que exigem a instalação de uma Comissão da Verdade, a abertura dos arquivos militares e a retirada, de vias públicas, de nomes de pessoas notoriamente coniventes com a repressão da ditadura.

O ministro Paulo Vannuchi, da Secretaria Especial de Direitos Humanos, cumpre honradamente seu dever de cidadão e autoridade pública: empenha-se para que a verdade venha à tona. O Brasil é o único país da América Latina, assolado no passado por ditadura militar, que prefere manter debaixo do tapete crimes cometidos por agentes públicos.

A lei da anistia, aprovada pelo governo do general João Figueiredo, é uma aberração jurídica. Anistia se aplica a quem foi investigado, julgado e punido - o que jamais ocorreu, no Brasil, com os responsáveis por torturas, assassinatos e desaparecimentos. Aqueles que lutaram contra o regime militar e pela redemocratização do país foram, sim, severamente castigados. Que o digam Vladimir Herzog e Frei Tito de Alencar Lima.

Tortura é crime hediondo, inafiançável e imprescritível. Ao exigir que se apure a verdade sobre o período ditatorial, o ministro Vannuchi e todos nós que o apoiamos não somos movidos por revanchismo. Jamais pretendemos fazer com eles o que eles fizeram conosco. Trata-se de justiça: descobrir o paradeiro dos desaparecidos; entregar às suas famílias os restos mortais dos que foram assassinados e enterrados clandestinamente; comprovar que nem todos os militares foram coniventes com as atrocidades cometidas pelo regime, em nome da "Segurança Nacional"; livrar as forças armadas da influência de figuras antidemocráticas que exaltam a ditadura e acobertam a memória de seus criminosos.

O presidente Lula não merece tornar-se refém dos saudosistas da ditadura. É a impunidade que favorece, hoje, a prática de torturas por parte de policiais civis e militares, como ocorre em blitzen, delegacias e cadeias Brasil afora.

Direito à verdade

É inútil os militares tentarem encobrir a verdade sobre o nosso passado. Até no filme de Fábio Barreto, Lula, o filho do Brasil, a truculência da ditadura é exposta em cenas reais e fictícias. Batismo de Sangue, de Helvécio Ratton - o filme mais realista sobre o período militar - revela como jovens estudantes idealistas eram tratados com uma crueldade de fazer inveja aos nazistas.

Participei, junto com Paulo Vannuchi, do projeto que resultou no livro Brasil, Nunca Mais (Vozes, 1985), assinado por Dom Paulo Evaristo Arns e o pastor Jaime Wright. Todas as informações contidas na obra foram obtidas na documentação encontrada no Superior Tribunal Militar. E, recentemente, o major Curió, que comandou a repressão à Guerrilha do Araguaia, abriu uma mala de documentos.

Anistia não é amnésia. O Brasil tem o direito de conhecer a verdade sobre a Guerra do Paraguai, Canudos e a ditadura instalada em 1964. Bisneto e neto de militares, sobrinho de general e filho de juiz de tribunal militar (anterior ao golpe), eu gostaria que os nossos Exército, Marinha e Aeronáutica fossem forças mais amadas que armadas.

Frei Betto é escritor e assessor de movimentos sociais, autor de Diário de Fernando - nos cárceres da ditadura militar brasileira (Rocco), entre outros livros. Artigo publicado pela agência Adital.

Para refletir:

Para viver, sinta, sonhe e ame.
Não deseje apenas coisas materiais.
Deseje o bem e multiplique as boas ações.
Sorria, sim. Mas ame mais.

Ame a si, aos outros, a quem está próximo e distante.
Ame quem errou e quem acertou.
Não diferencie.

O amor não julga. O amor não pune. O amor aceita.
Pense nisso e aceite a vida.

Vamos brincar com as palavras?



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